Arquidiocese de Braga -

3 outubro 2022

Presidente da Nicarágua apelida Igreja de “ditadura”

Fotografia CNS/Jorge Cabrera, Reuters

DACS com The Tablet

Daniel Ortega alegou sem provas que os bispos do seu país pediram aos manifestantes que o matassem durante os protestos em 2018.

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O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, chamou os líderes católicos de “gangue de assassinos” na quarta-feira, 28 de Setembro, em comentários que exacerbam a perseguição à Igreja e desprezam o apelo do Papa Francisco ao diálogo.

Num discurso inflamado, Ortega condenou os bispos católicos da Nicarágua por promoverem a democracia como uma saída para a crise política do país, alegando sem provas que pediram aos manifestantes que o matassem durante os protestos de 2018 – que o seu regime reprimiu violentamente.

Chamou os bispos e o Papa Francisco de “a ditadura perfeita” e depois perguntou, em tom acusador: “Quem elegeu os bispos, o Papa, os cardeais?”

Prosseguiu o discurso de comemoração dos 43 anos da Polícia Nacional: “Com que autoridade moral falam de democracia? Que comecem pelo voto católico... Tudo é imposto. É uma ditadura, a ditadura perfeita. É uma tirania, a tirania perfeita”.

O clero católico na Nicarágua permaneceu em silêncio enquanto Ortega – que venceu as eleições em 2021 depois de desqualificar e prender candidatos da oposição – perseguiu padres e bispos que falavam sobre questões de direitos humanos e deterioração democrática. O governo também encerrou iniciativas de caridade e educação administradas pela Igreja, juntamente com estações de rádio católicas, e expulsou padres e freiras, incluindo as Missionárias da Caridade.

Ortega afirmou nos seus comentários que era católico, mas não se sentia “representado”, em parte porque se ouvia falar de democracia, “mas eles não praticam a democracia”.

Os comentários surgem enquanto o bispo Rolando Álvarez, de Matagalpa, permanece em prisão domiciliar depois de ser retirado à força da cúria diocesana a 19 de Agosto. Os padres que foram presos com ele no ataque antes do amanhecer ainda estão detidos na famosa prisão de El Chipote, onde o regime mantém os seus presos políticos.

“Que ignorância! Tantas mentiras e tanto cinismo. Um ditador a dar lições de democracia”, tweetou o Bispo Auxiliar Silvio José Baez, de Manágua, que deixou o país por motivos de segurança em 2019.

“Alguém a exercer o poder de forma ilegítima, a criticar a autoridade que Jesus concedeu à sua Igreja; alguém que é ateu a lamentar não se sentir representado pela Igreja”.

O Papa Francisco quebrou o seu silêncio sobre a Nicarágua a 21 de Agosto, pedindo um diálogo “aberto e sincero”.

Afirmou a jornalistas a 15 de Setembro: “Há um diálogo. Isso não significa que aprovemos ou desaprovemos tudo o que o governo está a fazer”.

O Papa também exortou o governo da Nicarágua a permitir o regresso das Missionárias da Caridade e defendeu o ex-núncio apostólico, o arcebispo Waldemar Stanislaw Sommertag, que foi expulso da Nicarágua.

Ortega foi o primeiro presidente entre 1979 e 1990, depois de o movimento Sandinista derrubar o então ditador Anastasio Somoza. Mais tarde, venceu a eleição de 2006 e ganhou várias reeleições – embora a votação de 2021 tenha sido condenada como uma farsa por observadores internacionais e não reconhecida por países como os Estados Unidos.

No seu discurso – que incluiu denúncias de outros críticos internacionais e uma defesa dos testes nucleares da Coreia do Norte – Ortega criticou o secretário assistente dos EUA para os Assuntos do Hemisfério Ocidental, Brian Nichols, usando um insulto racial e troçando da sua aparência.

Observadores dizem que a relação entre Ortega e a Igreja Católica foi complicada durante as duas presidências de Ortega, especialmente com o falecido cardeal Miguel Obando Bravo. Ortega prometeu visitar a Basílica de Nossa Senhora de Guadalupe se voltasse ao poder e, em 2007, dirigiu-se directamente ao santuário mariano após desembarcar no aeroporto da Cidade do México.

O jornalista Carlos F Chamorro, director do jornal da Nicarágua Confidencial, diz que a Igreja entrou em confronto com Ortega depois de alguns padres e bispos mostrarem apoio aos manifestantes que pediram a deposição de Ortega em 2018, abrindo as suas paróquias aos feridos ou padres e paramilitares em fuga.

Chamorro disse ao Catholic News Service que Ortega “tem o objectivo de encerrar o último espaço cívico que resta no país, que é o espaço da liberdade de consciência, da liberdade de pregação e da liberdade religiosa”.

Artigo da CNS, publicado no The Tablet a 30 de Setembro de 2022.