Arquidiocese de Braga -

10 setembro 2021

Sínodo 2023: aprender a escutar e a ser paciente

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DACS

Conferência promovida pelo "The Tablet" teve como convidados a professora de Direito Canónico e consultora do Sínodo, Myriam Wijlens, e o Arcebispo de Liverpool, D. Malcolm Mahon.

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O Jornal “The Tablet” promoveu ontem uma conferência online, via Zoom, com o tema “Uma Igreja sinodal: o que é que isso significa?”. Moderado pelo jornalista Christopher Lamb, o debate teve como convidados a professora de Direito Canónico e consultora do Sínodo, Myriam Wijlens, e o Arcebispo de Liverpool, D. Malcolm Mahon.

Christopher Lamb começou a conversa sublinhando que o Sínodo é o projecto mais ambicioso de renovação da Igreja desde o Concílio Vaticano II e perguntou ao Arcebispo Malcolm que lições tinha retirado do Sínodo de Liverpool.

“Em primeiro lugar, o Espírito guia-nos, mas temos que estar abertos à sua orientação e depois discernir. O Espírito não é um botão que se ligue e desligue, vive na comunidade e temos de encontrar a forma de o encontrar e ouvir. Outra lição aprendida: tivemos que aprender a escutar. Tanto o Espírito, como uns aos outros! Ouvir-nos uns aos outros começou por ser muito difícil, mas as pessoas puderam conhecer-se melhor ao escutarem-se. E, por último, também tivemos que aprender a ordenar e trabalhar as sugestões que nos foram dadas… às centenas. Não descartámos nenhuma. Também foi um processo difícil, mas conseguimos. Em suma, aprender que as coisas demoram o seu tempo e que é preciso ser paciente são as maiores lições”, afirmou.

 

“As coisas já estão a mudar. Já há papéis litúrgicos abertos às mulheres e leigos. Como é que podemos dizer que nada está a mudar?”

 

Ainda sobre o Sínodo de Liverpool, o Arcebispo afirmou que este não é um processo encerrado, mas sim contínuo, assim como a renovação da Igreja.

“É, sem dúvida, um processo contínuo. Ainda estamos a perceber o que temos de fazer. Tivemos um grupo de trabalho especialmente dedicado ao Sínodo e ainda estamos a decidir o trabalho pastoral que será lançado a partir desse processo, que esperemos ser sinodal”, adiantou.

Sobre a possibilidade de Inglaterra e País de Gales levarem a cabo um sínodo nacional, D. Malcolm afirmou de imediato que o encorajaria, assim como, acredita, a maioria das dioceses.

“Algumas poderiam estar mais relutantes, mas acho que a maioria delas gostaria de participar nesse Sínodo. Se não nos reunirmos e não nos escutarmos, não há futuro. Para além disso, creio que as dioceses acabam por se inspirar e encorajar umas às outras, as mais relutantes certamente seguiriam os passos das outras. Somos todos chamados a participar”, explicou.

A dimensão do ecumenismo, também trabalhada no Sínodo de Liverpool, foi outro dos aspectos abordados pelo Arcebispo.

 

“Na fase de auscultação, também são muitas as mulheres que vão participar, mesmo que estejam em minoria. E a questão continua a ser se elas participam ou não nos processos de tomada de decisão? Essa não devia ser a questão principal; devíamos era perguntar-nos se noutros locais do mundo elas vão participar. Quem falta e porquê?…”

 

“O ecumenismo na nossa diocese já acontecia, independentemente de qualquer Sínodo. É parte do ADN de ser um cristão de Liverpool. Somos todos Povo de Deus porque somos todos baptizados. Trabalhamos em conjunto, aprendemos muito sobre o ministério e a forma como o conduzimos, ou sobre o papel das mulheres na vida da Igreja, por exemplo. Aprendemos muito uns com os outros, mesmo sobre formas de governação”, sublinhou.

Já no final do debate, questionado por um dos participantes sobre a renovação e mudanças reais na Igreja, D. Malcolm foi claro: “Agora temos mulheres acólitas, passamos a ter um ministério do catequista, não têm faltado mudanças… Até mudanças de atitude, que é o mais difícil!”.

A professora Wijlens, por sua vez, começou a sua intervenção apontando a novidade deste Documento Preparatório, que até se encontra disponível em booklet e que possui um logótipo próprio. Ainda sobre o documento e a necessidade de escuta do Povo de Deus, Wijlens explicou que a ideia não é nova e lembrou a “Lumen Gentium”, a Constituição Dogmática do Concílio Vaticano II.

“O Papa Francisco, nisto, não está a introduzir nada de novo, está a restabelecer ou a reconfigurar a forma como interagimos uns com os outros à luz do capítulo do Povo de Deus da Lumen Gentium. Somos todos baptizados, temos todos o direito e o dever de participar na vida Igreja. Isso é que é sinodalidade, caminhar em conjunto”, afirmou.

A novidade passa por questões mais estruturais, como o facto de as sessões preliminares agora fazerem parte do Sínodo, ao contrário do que acontecia anteriormente. Desta forma, as Igrejas locais conseguem participar activamente no Sínodo.

 

“Ouvir-nos uns aos outros começou por ser muito difícil, mas as pessoas puderam conhecer-se melhor ao escutarem-se.”

 

“Se olharmos para o Concílio Vaticano II, sabemos que teve uma longa preparação nas igrejas locais. O Concílio é o belo resultado de desenvolvimentos que tiveram lugar nas igrejas locais e que foram, posteriormente, debatidos pelos bispos no Sínodo. É por isso que o processo que estamos agora a iniciar começa nas Igrejas locais de forma muito consciente”, explicou.

A professora reflectiu ainda sobre a necessidade de todo o Povo de Deus se concentrar nos verdadeiros objectivos do Sínodo, sublinhando que a experiência da sinodalidade passa por olhar para o caminho a percorrer, questionando se o mesmo trará, efectivamente, unidade à Igreja.

Questionada sobre o poder de voto da Irmã Nathalie Becquart, Wijlens não foi capaz de deixar de sorrir e de perguntar se tanta conversa em torno desse assunto não estará a desviar as pessoas daquilo que é realmente importante.

“Eu estive envolvida na redacção do Documento Preparatório, assim como um número substancial de mulheres. Na fase de auscultação, também são muitas as mulheres que vão participar, mesmo que estejam em minoria. E a questão continua a ser se elas participam ou não nos processos de tomada de decisão? Essa não devia ser a questão principal; devíamos era perguntar-nos se noutros locais do mundo elas vão participar. Quem falta e porquê?…”, perguntou.

 

“Agora temos mulheres acólitas, passamos a ter um ministério do catequista, não têm faltado mudanças… Até mudanças de atitude, que é o mais difícil!”.

 

Reiterando as palavras do Arcebispo Malcolm, Wijlens também disse que depois de 2023, o processo sinodal irá certamente continuar, já que se trata de um processo contínuo. Sobre deixar de ser um Sínodo “dos Bispos” para passar a ser “do Povo de Deus”, a responsável afirmou que o Sínodo em si ainda é uma novidade.

“Os Bispos perceberam o quão bom era ouvirem-se uns aos outros, como podiam aprender tanto em conjunto e tiveram que arranjar uma modalidade para fazer as coisas funcionar. Se podíamos pensar em algo como existe na Austrália, um Conselho Plenário? Claro, mas tudo tem o seu tempo”, adiantou.

Sobre mudanças futuras ou já em curso, “reais mudanças”, como apontou um dos participantes, a resposta de Wijlens também foi peremptória.

“As coisas já estão a mudar. Já há papéis litúrgicos abertos às mulheres e leigos. Como é que podemos dizer que nada está a mudar?”, questionou.