Arquidiocese de Braga -

10 maio 2021

Um edifício religioso desaparece em França a cada duas semanas

Fotografia Jean-Baptiste Monnot

DACS com National Catholic Register

Presidente do Observatório do Património Religioso de Paris fala de degradação dos edifícios e alerta: a continuar assim, "vamos perder tudo".

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Esta é a conclusão de Edouard de Lamaze, presidente do Observatório do Património Religioso de Paris.

O responsável encontra-se a alertar os órgãos de comunicação franceses sobre o desaparecimento gradual de edifícios religiosos num país conhecido como “a filha mais velha da Igreja” por o rei Clóvis I ter abraçado o catolicismo em 496.

O apelo de Lamaze para uma aumento de consciência neste sentido surgiu depois de um incêndio ter destruído a Igreja de Saint-Pierre, do século XVI, em Romilly-la-Puthenaye, Normandia, norte da França. O incêndio, considerado acidental, ocorreu a 15 de Abril, exactamente dois anos após o incêndio que devastou a Catedral de Notre-Dame em Paris.

A imagem inesquecível da catedral em chamas, que percorreu o planeta em 2019, apontou para uma questão mais profunda na sociedade francesa: graves deficiências no sistema de preservação de monumentos religiosos, juntamente com o aumento de hostilidade contra a religião.

Lamaze disse, em entrevista à Catholic News Agency, que, além de um edifício religioso desaparecer a cada duas semanas – por demolição, transformação, destruição por incêndio ou desabamento – dois terços dos incêndios em edifícios religiosos são de origem criminosa.

Embora essas estatísticas incluam edifícios pertencentes a todos os grupos religiosos, a maioria diz respeito a monumentos católicos, que ainda representam uma grande maioria em França, onde existem cerca de 45.000 locais de culto católicos.

“Embora os monumentos católicos ainda sejam em maior número, uma mesquita é erigida a cada 15 dias em França, enquanto um edifício cristão é destruído ao mesmo ritmo. Isso cria um ponto de inflexão no território que deve ser levado em consideração”, disse Lamaze.

O responsável acredita que, em média, mais de dois monumentos cristãos são alvo de crime ​​todos os dias. Dois terços desses incidentes envolvem roubo, enquanto o terço restante envolve profanação.

De acordo com os dados mais recentes da unidade central de inteligência criminal da França, 877 ataques a locais de culto católicos foram registados em todo o país apenas em 2018.

“Esses números aumentaram cinco vezes em apenas 10 anos”, disse Lamaze, observando que 129 igrejas foram vandalizadas em 2008.

“No início da década de 1970, o escritor e jornalista Michel de Saint Pierre publicou um livro intitulado Églises en ruine, Eglise en péril [Igrejas em ruína, Igreja ameaçada de extinção], que já havia feito soar alarmes. Mas a situação aumentou dez vezes, ou até cem vezes mais, desde então”, explicou o presidente do Observatório.

Actualmente, 5.000 edifícios católicos correm o risco de desaparecer.

Para além da crescente hostilidade a que estão sujeitos, estes locais religiosos também sofrem de profunda negligência por parte das autoridades públicas.

Esta situação é parcialmente explicada pelo facto de, em virtude da lei de 1905 sobre a Separação das Igrejas e do Estado, os municípios se terem tornado proprietários dos edifícios religiosos em França. Em muitos casos, não conseguiram arcar com os custos de manutenção dos locais.

“Esses edifícios não são mantidos há mais de um século e nunca foram submetidos a trabalhos de restauração ou medidas de protecção contra roubo ou incêndio”, disse Lamaze.

O presidente explicou que apenas 15.000 sítios católicos são oficialmente protegidos como monumentos históricos, enquanto os outros 30.000 edifícios estão praticamente degradados.

Lamaze afirmou ainda que outro exemplo significativo e emblemático da má gestão desse património é a Abadia de Saint-Ouen, uma jóia da arquitectura gótica pertencente à cidade de Rouen, na Normandia.

“Esta igreja da Abadia é dotada de um forêt [estilo distinto de cobertura da igreja] que é ainda maior do que o de Notre-Dame. É absolutamente maravilhoso e, no entanto, não tem nenhum sistema de alarme de qualquer tipo. É mais um candidato à destruição. É o suficiente para fazer chorar”, adiantou.

Lamaze explicou que os incêndios também estão a aumentar drasticamente porque os edifícios estão cada vez mais degradados, e essa negligência também atrai muitos roubos de pinturas, estátuas ou cálices de ouro.

Embora as catedrais francesas tenham um status especial e sejam de propriedade do Estado, não foram poupadas pela onda de incêndios que atingiu locais católicos nos últimos anos. O incêndio em Notre-Dame, em 2019, foi precedido por um incêndio na Catedral Saint-Alain de Lavaur em Tarn, Sul da França, e seguido por um incêndio nas catedrais de Rennes e Nantes em 2020.

“O actual ministro da cultura está a tentar estabelecer uma carta de protecção, mas a situação é extremamente grave e, infelizmente, não vejo um real aumento de consciência, nem qualquer sentido de responsabilidade diante deste desafio crucial para o nosso património nacional”, disse Lamaze.

“Na verdade, além do aspecto religioso, é a cultura do nosso país que está em jogo, já que essas jóias da arte e da arquitectura são parte integrante do espírito e da grandeza da França. E, se continuarmos assim, um dia a nossa herança será completamente destruída. Vamos perder tudo”, concluiu.

 

Artigo de Solène Tadié, publicado no National Catholic Register, a 4 de Maio de 2021.