Arquidiocese de Braga -

2 setembro 2022

No Chile, um estudo especifica as circunstâncias das agressões sexuais por parte do clero

Fotografia ALBERTO PEÑA/EFE/MAXPPP

DACS com La Croix

A comissão responsável pelo apoio às vítimas publicou um estudo sobre as circunstâncias das agressões sexuais cometidas por padres. A vulnerabilidade da vítima e o abuso espiritual levam ao abuso sexual no ambiente eclesial.

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Em Maio de 2018, todos os bispos chilenos apresentaram as suas renúncias ao Papa Francisco, que os convocou a Roma. Se nem todos deixaram a sua sede episcopal, a Igreja chilena perdeu a confiança dos fiéis. A gestão calamitosa de agressões sexuais manchou profundamente a instituição.

Pouco a pouco a verdade está a ser reposta, e a publicação de um novo estudo confirma tanto a gravidade dos factos, quanto a reacção dentro da Igreja para finalmente sair da negação. Assim, o Conselho Nacional para a Prevenção do Abuso e Acompanhamento de Vítimas da Conferência Episcopal do Chile publicou, no sábado, 20 de Agosto, o resumo de um estudo que inclui aspectos qualitativos e quantitativos relacionados com a agressão sexual e o quadro em que o abuso foi tendo lugar. Uma maneira de responder ao apelo do Papa Francisco para “aprofundar a procura pelas raízes e estruturas que permitiram que esses eventos particulares acontecessem e continuassem”.

 

Impacto espiritual

A investigação foi realizada “levando em consideração os aspectos qualitativos e quantitativos, querendo compreender o papel da componente psico-religiosa no processo de construção do relacionamento abusivo, e o impacto espiritual que isso tem na vítima”, explica o relatório do estudo. Quanto aos aspectos quantitativos da análise, segundo os autores, trata-se de “mensurar e caracterizar as situações em que relacionamentos abusivos emergem de questionários complementados por informações de arquivos canónicos ou estatais”.

Cruzando fontes judiciais e canónicas, a investigação, fragmentada, recolheu, no entanto, informação de 21 das 27 dioceses existentes no país e de 14 congregações religiosas. “O relatório contém os testemunhos de 461 vítimas/sobreviventes e 168 agressores no total”, especifica.

A investigação concentrou-se em agressores que provocaram pelo menos uma vítima menor. 25% dos casos ocorrem na paróquia, 10,77% com o próprio clérigo. 93,2% das vítimas foram tocadas e metade das agressões constituíram violação.

 

Vulnerabilidades

A esta constatação soma-se a análise das circunstâncias que podem ter levado ao abuso sexual: “Identificam-se também certas dinâmicas relacionais do clérigo religioso, ou não clerical, com a comunidade, como a constituição de um grupo fechado; estabelecimento de relações privilegiadas ou exclusivas com determinados membros da comunidade; criação de dinâmicas competitivas entre os jovens”, estigmatizam os autores.

O relatório detalha, no caso de menores, uma forte participação nas comunidades religiosas que se conjuga com “a existência de uma vulnerabilidade económica devido a rendimentos precários, ou uma vulnerabilidade emocional gerada pela morte de um dos pais ou de um irmão ou irmã, ou por relações familiares disfuncionais”. O “perfil” das vítimas é diferente nos adultos, que são mais confrontados com situações conflituosas da vida, crise conjugal, profissional, laboral, económica…

Como muitas vezes, as agressões sexuais fazem parte de situações de abuso espiritual, alerta o relatório, nomeadamente “o uso da fé professada pela vítima que se especifica na manipulação da consciência e na distorção do discurso religioso no esforço de normalizar ou justificar as suas abordagens sexualmente abusivas em relação a ela”.

 

Prevenção

O estudo, que em muitos aspectos se assemelha ao trabalho da comissão Sauvé em França, preocupa-se com o atendimento às vítimas e a prevenção. Destacando a importância de ouvir as vítimas, o relatório afirma que “os sobreviventes decidiram participar na investigação como forma de contar a história do ocorrido”. Quanto à prevenção, segundo o relatório, envolve “os cuidados especiais que devem ser dirigidos ​​às crianças e aos adolescentes, nos sacramentos, na educação na fé, nas relações exclusivas ou privilegiadas entre o sacerdote/religioso e certos fiéis”.

Artigo de Christophe Henning, publicado no La Croix a 21 de Agosto de 2022.