Arquidiocese de Braga -
1 julho 2022
Jovens católicos de esquerda na Bélgica realizam encontro de Verão
DACS com La Croix International
Um movimento de justiça social e jovens católicos ambientalmente conscientes está a surgir na Europa à luz das várias crises que a Igreja institucional está a enfrentar.
Entre os novos grupos católicos de esquerda política, a Bélgica não ficou muito atrás.
Um grupo de estudantes de doutoramento e jovens activistas envolvidos na Igreja está a organizar um seminário de verão de 29 a 31 de Julho em torno da questão: “O que é que os cristãos podem fazer para trabalhar pelo bem comum?”.
O encontro de três dias será realizado ao ar livre no meio da natureza no Quartier Gallet, um centro de retiros criado no espírito da Communion de La Viale, grupo fundado em 1968 pelos jesuítas belgas.
O centro está localizado na cidade de Beauraing, que fica na fronteira francesa, a cerca de 50 quilómetros do sul de Namur.
As cerca de 60 pessoas que são esperadas no encontro irão acompanhar conferências sobre o capitalismo e a teologia da libertação.
Também irão partilhar “momentos de fraternidade e oração” e terão a oportunidade de estabelecer vínculos com outros crentes comprometidos com a justiça social.
Voltar a ligar-se à tradição social
A ideia deste encontro partiu de Jean-Baptiste, Matthias, Julien e alguns outros, todos amigos de longa data. Queriam fazer alguma coisa porque percebem que algo está “a faltar” nas propostas da Igreja Católica.
“Em retiros ou acampamentos, pode haver tópicos sobre compromisso moral na sociedade, mas é só isso”, diz Jean-Baptiste, doutorando em Filosofia da Tecnologia na Universidade Católica de Louvain e catequista na sua paróquia.
Ele e os seus amigos estão profundamente preocupados com a “origem estrutural da pobreza e da crise ecológica”. Acreditam que existem recursos cristãos que podem fornecer ferramentas conceptuais para a construção de uma crítica coerente do “sistema capitalista”.
Jean-Baptiste diz que este desafio é “pensar como é que a Igreja se pode voltar a ligar à sua tradição social enquanto se está a tornar gentrificada”.
Um dos eventos recentes que levaram estes amigos a lançar esta iniciativa foi a magnitude da crise de abuso sexual do clero que foi revelada em Outubro passado num relatório da Comissão Independente em França (CIASE).
“Sinto que os escândalos me desinibiram”, diz Matthias, doutorando em Direito comprometido com questões de justiça ambiental.
“Antes, eu não me sentia bem em abrir certos debates, mas acho que a partir de agora os leigos devem manifestar-se, já não podemos deixar o governo da Igreja apenas para o clero”, explica.
Durante o fim-de-semana de Julho, querem discutir a dimensão sistémica de tal abuso, bem como a “misoginia tenaz embutida na instituição”.
“Não queremos mais colaborar com uma instituição culpada sem sermos ouvidos”, resume Jean-Baptiste.
Enquanto a maioria dos organizadores são católicos, um deles é protestante. Todos eles são movidos pelo mesmo desejo de levantar a voz. É um ecumenismo mais evidente para os belgas do que para os vizinhos franceses, explica Jean-Baptiste.
“Não temos uma comunidade católica suficientemente grande, como em França, para que eventos deste tipo congreguem apenas católicos praticantes”, explica, o que também está de acordo com o desejo de “unir os cristãos”.
Apesar desse desejo, reconhecem prontamente os limites do seu empreendimento. O público esperado será maioritariamente católico e composto por pessoas com menos de 30 anos, com ideias políticas convergentes.
De facto, estas iniciativas de jovens cristãos supereducados e radicados na esquerda deixam sem solução a questão do diálogo entre cristãos de todas as sensibilidades.
A socióloga Danièle Hervieu-Léger publicou recentemente um livro sobre o colapso do catolicismo na França (Vers l'implosion?), que mostra claramente como, acima de tudo, os crentes estão a reunir-se em grupos de mentalidade semelhante, em comunidades cada vez mais fechadas.
A ascensão de uma “identidade cristã”
Esta tendência pretende opor-se a outra, a de uma “identidade cristã”, encarnada por um dos maiores políticos de extrema direita de França, Éric Zemmour.
Apesar da sua tentativa fracassada de tornar-se presidente nas recentes eleições, atraiu o apoio de muitos católicos praticantes.
Diante desse fenómeno, estes jovens sentem a necessidade de elaborar outra narrativa, que tenha as suas raízes no catolicismo social. Em França, algo chamado rede Anastasis está envolvido nessa tendência ainda incipiente.
“Fazemos parte de uma dinâmica alternativa na Igreja, que quer propor um discurso solidário e ecológico”, confirma Julien, voluntário permanente da ATD Quarto Mundo.
Convidaram Anne Waeles, co-autora do ensaio La Communion qui vient e membro da Anastasis, para ministrar uma conferência sobre o “poder político dos Evangelhos”.
Haverá várias propostas de reflexão. Por exemplo, Jean-Christophe Defraigne, professor de economia que apelidou o capitalismo de “estrutura de exploração”, será um dos palestrantes.
Mas, além disso, os organizadores querem ajudar a criar laços entre o indivíduo e os grupos presentes. O cenário “sóbrio e rústico” do encontro – que fica num local administrado por um jesuíta no meio da natureza e composto por uma antiga fazenda, algumas casinhas e uma capela – devem contribuir para essa ligação, assim como os “momentos de trabalho colectivo”.
Artigo de Théo Moy, publicado no La Croix International a 30 de Junho de 2022.
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