Arquidiocese de Braga -

20 junho 2022

Lucetta Scaraffia denuncia “falha sistémica” da Igreja contra os abusos

Fotografia DR

DACS com Vida Nueva Digital

A historiadora publicou um ensaio sobre a situação italiana para fazer a voz das vítimas chegar à opinião pública.

\n

Lucetta Scaraffia definiu-se como uma “avó” disposta a dar a conhecer a todos as histórias de vítimas de abuso em ambientes eclesiais na Itália.

Para isso, a colaboradora do Vida Nueva, juntamente com Anna Foa e Franca Giansoldati, publicou o livro “Agnus Dei. O abuso sexual do clero na Itália” (Solferino Editore, 2022).

É que na opinião pública do país transalpino ainda mal se aprofundou na sangrenta realidade diante da qual o Papa Francisco exige “verdade, justiça e acompanhamento para a cura”.

 

Responsabilidade institucional

Em entrevista ao site Il sismografo, Scaraffia destaca a responsabilidade institucional de quem tem que garantir que não ocorram abusos e o porquê de a Igreja “na grande maioria dos casos, se ter calado e tentado encobrir o escândalo sem se preocupar com os danos sofrido pela vítima”.

Neste sentido, destacou o apelo de Bento XVI quando assinalou, depois de tomar conhecimento da investigação realizada na Alemanha, que “não se sentia irrepreensível em geral, ao ter ocupado cargos importantes dentro da Igreja” e que por isso “pediu à instituição no seu conjunto que assumisse total responsabilidade pelos abusos, sobretudo pela falta de reconhecimento do crime e pela dor das vítimas. Mas até agora a sua voz permaneceu isolada.”

A historiadora pede para se ir além de mostrar a “nossa vergonha” e fazer uma “hermenêutica histórica” a nível histórico e moral.

“A hermenêutica histórica, do ponto de vista moral, não significa que o abuso sexual deva ser julgado de acordo com as teorias da época em que foi perpetrado: são crimes, e a pena para crimes deve ser sempre a mesma, não pode mudar. Pelo menos dentro da moral católica”, alerta, já que isso resultou numa acção, por parte das “hierarquias eclesiásticas de negar os abusos, de apagar a voz das vítimas”.

Nesse sentido, Scaraffia denuncia a “falha sistémica” vivida na Igreja porque o problema foi enfrentado a partir de “um sistema que inclui tanto uma supervalorização da figura sacerdotal – que transformou o papel do serviço aos fiéis num papel de poder social e psicológico – como uma adesão tácita das hierarquias à prática de sufocar escândalos para «salvar o bom nome da instituição»”.

Por isso, pede também para se “repensar o Código de Direito Canónico”, no qual a “violação” não é um crime, mas simplesmente “um pecado individual de impureza”.

“É preciso mudar todo o ordenamento jurídico e também um sistema cultural que nunca teve em conta o vínculo entre sexualidade e poder como questão central nas relações humanas e de género em particular”, afirmou.

Artigo de Mateo González Alonso, publicado em Vida Nueva Digital a 20 de Junho de 2022.