Arquidiocese de Braga -

31 maio 2022

Novo cardeal brasileiro destaca preocupação do Papa com a região Amazónica

Fotografia Pe. Luís Miguel Modino

DACS com Crux

Nascido em 1950 em Santa Catarina, no sul do Brasil, foi ordenado padre franciscano em 1978 – pelo cardeal Paulo Evaristo Arns, seu primo – e em 2005 foi ordenado bispo, nomeado para a prelatura de São Félix do Araguaia.

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Anunciado como um dos 21 novos cardeais que o Papa Francisco criará a 27 de Agosto, o arcebispo brasileiro Leonardo Ulrich Steiner, de Manaus, é esperado por muitos na região para ser a voz da Amazónia no Vaticano.

Como secretário-geral da Conferência Episcopal Brasileira entre 2011-2019, acompanhou todo o trabalho preparatório para o Sínodo da Amazónia, que aconteceu no Vaticano em 2019, mas o seu contacto com a região começou anos antes.

Nascido em 1950 em Santa Catarina, no sul do Brasil, foi ordenado padre franciscano em 1978 – pelo cardeal Paulo Evaristo Arns, seu primo – e em 2005 foi ordenado bispo, nomeado para a prelatura de São Félix do Araguaia.

Localizada no estado de Mato Grosso, na Amazónia, São Félix do Araguaia é uma área notoriamente recheada de conflitos, onde camponeses e povos indígenas têm sido historicamente atacados por grandes latifundiários. A prelatura era administrada pelo bispo catalão Pedro Casaldáliga desde 1971.

Activista da teologia da libertação, Casaldáliga era conhecido pela sua persistente defesa dos pobres e pela sua crítica às estruturas de poder, incluindo na igreja – algo que às vezes causava atritos.

“Depois da renúncia de D. Casaldáliga, o núncio apostólico pediu que deixasse São Félix quando Steiner chegasse”, lembrou D. Edson Damian, de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas.

Steiner não só disse a Casaldáliga que continuasse a morar na prelatura, como anunciou que iriam morar na mesma casa, disse Damian. “De alguma forma mostrou que ele e Casaldáliga partilhavam as mesmas ideias.”

As posições firmes de Steiner em questões pastorais e sociais contribuíram para torná-lo uma voz forte nos média, disse o padre espanhol Luis Miguel Modino, oficial de comunicação do capítulo regional Norte 1 da Conferência Episcopal.

“Não é um bispo que fica em cima do muro. Quando ele fala, as pessoas ouvem-no. Desde que se tornou arcebispo de Manaus, passou uma mensagem forte e profética”, disse ao Crux.

Steiner teve que lidar com duas grandes crises desde 2020: a crescente devastação da floresta tropical e a pandemia de COVID-19. Ambas foram agravadas pelos movimentos políticos de apoio aos aliados do presidente Jair Bolsonaro, que minimizaram a gravidade da pandemia e incentivaram o desenvolvimento económico da floresta tropical.

O número recorde de incêndios florestais na Amazónia nos últimos anos teve um impacto severo em Manaus, o principal centro urbano da região, com mais de 2,2 milhões de pessoas.

Muitas vezes, pessoas de perto que sofrem de doenças causadas pelo fumo são enviadas para a cidade, e comunidades ribeirinhas e indígenas deslocadas costumam ir a Manaus em busca de trabalho.

Assim que a Covid a atingiu, Manaus tornou-se um dos epicentros da pandemia no Brasil. A falta geral de infraestrutura de saúde na região amazónica fez com que milhares de pacientes inundassem os hospitais da cidade, que logo entraram em colapso.

A inacção dos governos federal e estatal piorou a situação. Em vez de atender à urgência, o governo Bolsonaro enviou para Manaus os chamados “kits preventivos” – medicamentos como hidroxicloroquina e ivermectina, cuja eficácia no tratamento da Covid não foi comprovada cientificamente.

“O presidente chegou a dizer que não era tarefa do governo federal enviar oxigénio para Manaus. Como é que isso é possível? É um absurdo. Nota-se que se perdeu o limite da ignorância, perdeu-se o limite das acções contra a população. Eles foram eleitos para cuidar do povo, mas não é isso que está a acontecer”, disse Steiner mais tarde em entrevista ao site de notícias brasileiro Tutaméia.

Apesar da sua firmeza, Steiner “provou a sua capacidade de evitar a polarização política e continuou a exercer uma liderança pacífica”, disse o padre Zenildo Lima da Silva, reitor do seminário da Arquidiocese de Manaus.

“Ele não perdeu tempo a responder aos seus críticos. Trabalhou com a igreja para organizar campanhas de doação e obter ajuda nacional e internacional. Assim, Manaus centralizou o alívio para várias outras regiões da Amazónia”, acrescentou Silva.

Durante a pior fase da pandemia, Steiner organizou assistência espiritual para pacientes e familiares dos mortos nas comunidades da igreja e nas funerárias. Ao mesmo tempo, participou na distribuição de medicamentos e equipamentos médicos.

“Ele estava tão preocupado com tudo. Uma vez vi-o pessoalmente a ajudar a descarregar um camião com cilindros de oxigénio”, lembrou Modino.

Steiner costuma sujar as mãos, embora não goste de divulgar essa abordagem, acrescentou Modino. “Ele tem promovido muito a pastoral dos sem-abrigo em Manaus e, às vezes, participa na distribuição de refeições quentes”, disse.

Em Abril, Steiner foi nomeado presidente da Comissão Episcopal Especial para a Amazônia. É também vice-presidente da Conferência Eclesial da Região Amazónica (CEAMA).

“Ele tem um profundo compromisso com os pobres e com a Amazônia. O bispo Steiner está envolvido num caminho sinodal e ministerial, que pode lidar com os desafios actuais da igreja”, disse a irmã Laura Manso, membro do CEAMA.

Damian disse que desde o sínodo da Amazônia muitos na igreja da região estavam à espera de um cardeal local.

“Os cardeais falam directamente com o papa. O Papa Francisco está preocupado com a Amazónia e certamente ouvirá Steiner sobre temas como desflorestação, invasão de terras, desrespeito aos povos indígenas”, disse o bispo.

Da Silva disse que a nomeação de Steiner como cardeal acelerará ainda mais a implementação de algumas das decisões do Sínodo da Amazónia.

“Ele está muito envolvido no debate de novos ministérios”, disse.

Ao mesmo tempo, poderá levar alguns elementos da igreja amazónica para a igreja global.

“O debate amazónico não é apenas sobre a Amazónia para o Papa. É sobre a dinâmica que a Igreja Amazónica pode apontar para a Igreja como um todo”, disse Silva.

A nomeação de Steiner pelo Papa é um sinal de tal perspectiva, disse Modino.

“Manaus não é uma grande referência no âmbito eclesial brasileiro. Mas o significado da Amazónia para a Igreja e para o mundo agora é gigantesco”, disse o padre.

Artigo de Eduardo Campos Lima, publicado no Crux a 30 de Maio de 2022.