Arquidiocese de Braga -
11 maio 2022
D. Peña Parra: a sinodalidade segundo Francisco, o caminho do terceiro milénio
DACS com Vatican News
O tema foi aprofundado pelo substituto da Secretaria de Estado durante uma conferência na Universidade Católica de Lisboa: as assembleias sinodais são o lugar onde o povo de Deus escuta “o que o Espírito diz às Igrejas”.
O Papa Bergoglio deu “novos e importantes impulsos à perspectiva da sinodalidade na Igreja, tanto que alguns autores falam mesmo de uma sinodalidade no tempo de Francisco”, sublinhando com esta expressão que “ele pretendia fazer da perspectiva de uma Igreja sinodal um ponto de força do seu pontificado”. Sem esquecer, é claro, que a sinodalidade constitui “um dado permanente da consciência eclesial”.
É o que salientou D. Edgar Peña Parra, substituto da Secretaria de Estado, falando na conferência realizada na manhã desta quarta-feira, 11 de Maio, no Instituto Superior de Direito Canónico da Universidade Católica de Lisboa.
Dedicado ao tema “Sinodalidade e comunhão no magistério do Papa Francisco: uma leitura à luz do direito canónico”, o encontro ofereceu ao prelado a oportunidade de examinar as diversas intervenções do magistério do pontífice para traçar “as linhas principais em que ele apresenta a sinodalidade entendida como expressão da eclesiologia de comunhão”.
O primeiro documento relevante sobre o tema é a exortação apostólica Evangelii gaudium, que “ainda não se refere explicitamente ao conceito de sinodalidade”, mesmo que “pelo menos dois princípios fundamentais possam ser identificados para a posterior elaboração deste conceito”. O primeiro é o “princípio missionário”, segundo o qual “a comunhão na Igreja se configura essencialmente como comunhão missionária”. Nela, todo o baptizado é “sujeito activo da evangelização”. E para isso é necessário desenvolver instrumentos de participação e “outras formas de diálogo pastoral, com o desejo de ouvir a todos e não apenas alguns, realizando assim o sonho missionário de chegar a cada pessoa”. O segundo princípio enunciado é o da “descentralização”, que o Papa define como “saudável” e que, nos próximos anos, colocará em prática através de várias intervenções legislativas, incluindo a recente constituição apostólica Prædicate Evangelium.
Os trabalhos sinodais sobre a família em 2014 e 2015 e a correspondente exortação apostólica Amoris lætitia mostram “progressos muito interessantes no método sinodal e, como tal, podem ser considerados uma prova de sinodalidade vivida”. A esse respeito, D. Peña Parra recordou o discurso – talvez o mais importante sobre a sinodalidade – que o Pontífice proferiu a 17 de Outubro de 2015, por ocasião do cinquentenário da instituição do Sínodo dos Bispos.
Nesse texto, o Papa Francisco descreve a sinodalidade como “o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milénio”. Citando São João Crisóstomo, segundo o qual “Igreja e Sínodo são sinónimos”, o Papa define a sinodalidade como “uma dimensão constitutiva da Igreja”. Isso implica “uma compreensão mais específica do próprio ministério hierárquico”: se a Igreja é um contínuo caminhar em conjunto, “dentro dela ninguém pode ser «elevado» acima dos outros”. Pelo contrário, na Igreja é necessário que alguém se «rebaixe», colocando-se ao serviço dos irmãos ao longo do caminho”.
O Papa Francisco usa “uma imagem sugestiva, comparando a Igreja a uma pirâmide invertida, onde o vértice está sob a base”. Segundo o Pontífice, a Igreja sinodal é “uma Igreja de escuta, uma escuta enraizada no sensus fidei da totalidade dos fiéis”, que “impede uma separação rígida entre Ecclesia docens e Ecclesia discens”.
O substituto lembrou também que durante o pontificado de Francisco a Comissão Teológica Internacional realizou um estudo sobre o tema, cujo fruto foi publicado no documento A sinodalidade na vida e missão da Igreja, a 2 de Março de 2018. O documento “não só resume a posição geral da Igreja, mas também parece dar uma chave de leitura do pensamento do Papa sobre a sinodalidade”, introduzindo uma “visão eclesiológica que promove o desenvolvimento da comunhão sinodal entre «todos», «alguns» e «um»”. A esse respeito, Peña Parra especificou que a sinodalidade implica “o exercício do sensus fidei da universitas fidelium (todos), o ministério de liderança do colégio episcopal, cada um com o seu presbitério (alguns), e o ministério de unidade do bispo e do Papa (um)”. Além disso, a sinodalidade não é “simplesmente um procedimento operativo, mas o modo particular como a Igreja vive e trabalha”.
Na Carta ao Povo de Deus em caminho na Alemanha, de 29 de Junho de 2019, o Pontífice sublinha “a importância da orientação do Espírito Santo para todas as actividades de carácter sinodal”. Porque a sinodalidade “pressupõe e exige a efusão do Espírito Santo”. Quanto à comunhão hierárquica, o Papa distingue duas dimensões: “sinodalidade de baixo e sinodalidade de cima”.
O Pontífice, então, voltou ao tema “da essencialidade do Espírito Santo para a sinodalidade” no seu discurso aos fiéis da diocese de Roma proferido a 18 de Setembro de 2021. Recordando a passagem dos Actos dos Apóstolos relativa ao Concílio de Roma Jerusalém, Bergoglio sublinhou a “diferença entre as assembleias parlamentares ou democráticas e as assembleias sinodais onde o povo de Deus escuta «o que o Espírito diz às Igrejas»”.
Finalmente, no seu discurso durante o momento de reflexão para o início do caminho sinodal, pronunciado a 9 de Outubro de 2021, o Papa Francisco definiu as três palavras-chave do Sínodo: “comunhão, participação e missão”. Enquanto a comunhão expressa “a própria natureza da Igreja e a missão corresponde ao compromisso apostólico com o mundo contemporâneo”, a participação “garante que as duas primeiras, ou seja, comunhão e missão, não se tornem termos abstractos”, mas se expressem “em acções concretas da sinodalidade em todas as fases do caminho e da actividade, promovendo o envolvimento efectivo de cada um”.
A recente constituição apostólica Prædicate Evangelium, destacou o prelado, também reflecte o que já foi enfatizado na Evangelii gaudium e posteriormente desenvolvido nas intervenções papais.
De acordo com a nova constituição apostólica, “o próprio exercício do serviço da Cúria Romana deve ser essencialmente sinodal”. Como foi sublinhado no momento da apresentação do documento, “a sinodalidade neste contexto particular realiza-se como sinodalidade intradicasterial, sinodalidade interdicasterial e sinodalidade com a Secretaria Geral do Sínodo dos Bispos”.
Artigo do L’Osservatore Romano, publicado no Vatican News a 11 de Maio de 2022.
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