Arquidiocese de Braga -

23 fevereiro 2022

Segundo aniversário de “Querida Amazónia”, a pegada viva de Deus num povo a caminho

Fotografia

DACS com Vida Nueva Digital

Processos de reforma na América Latina estão a ocorrer a partir dos quatro sonhos propostos pelo Santo Padre na exortação: um sonho social, um sonho cultural, um sonho ecológico e um sonho eclesial.

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Dois anos após sua publicação, “Querida Amazónia” é uma carta de amor do Papa Francisco para afirmar que as propostas e vozes do Povo de Deus encarnado no território são relevantes. Em muitos lugares, a reflexão continua, assumindo, incorporando algumas das grandes inovações como propostas pastorais. Embora para alguns este segundo aniversário possa parecer insignificante, a verdade é que a emergência de um novo sujeito eclesiológico continua a surgir e a dar lugar à esperança.

A Conferência Eclesial da Amazónia – CEAMA –, por exemplo, é um resultado directo dessa experiência do Sínodo, e foi reafirmada como um novo caminho necessário pela exortação apostólica “Querida Amazónia”. Esta estrutura nascente é o instrumento capacitador em construção, já com a aprovação canónica – ad experimentum – do Papa, para garantir que, em chave estrutural, com uma perspectiva de longo prazo e com uma perspectiva territorial regional e plenamente eclesial, se prossiga o caminho nestes processos pelos quais ansiamos serem irreversíveis.

Aqui reside a grande novidade, pois muito além de um documento inspirador, a “Querida Amazónia” acolheu, afirmou e abraçou todo um programa pastoral, socio-político-ambiental e, mais importante ainda, é que a periferia que irrompeu no centro para iluminá-lo, continue.

Neste sentido, há muita vida em movimento na Amazónia, independentemente da terrível situação pandémica que continua a atingi-la, especialmente aos povos mais vulneráveis, e que reflecte justamente a urgência de novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral.

 

América Latina com selo de “Querida Amazónia”

Em relação às mudanças específicas que estão a ocorrer a nível regional em toda a América Latina, é fundamental destacar como esses processos de reforma se inspiram nos quatro sonhos que o Santo Padre propõe na “Querida Amazónia”. Quatro sonhos que vêm do Povo de Deus, que reflectem a vida, a esperança e as suas dores: um sonho social, um sonho cultural, um sonho ecológico e um sonho eclesial.

Além disso, este processo territorial desencadeou muitos dos dinamismos pastorais que agora estão a ser construídos no CELAM, articulação a partir de redes, plataformas temáticas e, sobretudo, iniciativas com uma visão muito mais ampla e uma visão ministerial com o cunho e enredo directo da “Querida Amazónia”.

Por outro lado, em toda a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe, recentemente realizada e ainda em processo, a sua forma de escuta, o método metodológico de preparação, a grande participação do Povo de Deus, a visão eclesial, não só episcopal, e a presença da periferia – dos improváveis – no processo, são fruto do caminho feito com o Papa Francisco na Amazónia.

Claro que há um longo caminho a percorrer, mas posso afirmar que o ritmo da Igreja na Amazónia, o ritmo da Igreja na América Latina e no Caribe, incluindo a influência em alguns aspectos da Igreja universal, têm o selo da “Querida Amazónia” e têm a marca viva deste povo de Deus a caminho, dos povos e comunidades indígenas e camponesas, das igrejas e dos membros da Igreja encarnada neste território.

 

Um processo articulador e dinamizador de vida

A outra grande novidade da “Querida Amazónia” é que muitas das instâncias anteriormente articuladas no território, como a Rede Eclesial Pan-Amazónica (REPAM) e outras, foram as que tiveram um papel preponderante na escuta e preparação do Sínodo da Amazónia que nos levou até à “Querida Amazónia”. Não menos importante, destaco a contribuição das organizações sociais na defesa do território e na coordenação regional e nacional dos povos originários, e outras plataformas articuladoras como o Fórum Social Pan-Amazónico (FOSPA) e a Aliança Mundial pela Amazónia.

Todas estas instâncias receberam um forte impulso desta exortação apostólica para reafirmarem as suas causas, os seus canais, os seus processos, as suas agendas. De facto, a amplitude de visão da “Querida Amazónia” conseguiu atender aos apelos do território e delinear com mão corajosa e olhar perspicaz o impulso para o futuro, porque as mudanças são necessárias e, de facto, urgentes.

Vimos como todas essas instâncias discerniram a partir da “Querida Amazónia” para reorientarem e reafirmarem as suas missões, reafirmarem ainda mais as causas de incidência sociopolítica e continuarem a produzir transformações nas suas respectivas áreas de missão. Sem a assembleia do Sínodo da Amazónia, o processo de escuta e a exortação apostólica, tenho a certeza absoluta de que a resposta da Igreja em coordenação com a sociedade e as comunidades diante da pandemia teria sido muito mais frágil, mais fragmentada, menos determinada e relevante.

Obviamente, todos estes esforços são insuficientes, pois irmãos e irmãs que vivem naquele território continuam a ser crucificados, assassinados por defenderem a vida, perseguidos, criminalizados, até a desflorestação cresceu implacavelmente durante a pandemia, mas a força dos processos também se viu revestida da presença do Espírito Santo e desde aí que nos sustentamos na esperança, na comunhão, e isso graças a esta exortação, que a 2 de Fevereiro completou dois anos.

 

Artigo de Mauricio López Oropeza, Director do Centro Pastoral de Acção Social e Redes do CELAM, publicado em Vida Nueva Digital a 23 de Fevereiro de 2022.