Arquidiocese de Braga -

29 julho 2021

Diocese na Suíça torna-se um “laboratório” para a liderança leiga

Fotografia DR

DACS com La Croix International

Um olhar mais atento sobre a Diocese Católica de Lausanne, Genebra e Friburgo, onde o Bispo nomeou leigos para serem os seus “Vigários” em certas regiões.

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Uma pequena revolução eclesial está actualmente a ocorrer na Diocese Católica de Lausanne, Genebra e Friburgo (LGF), na Suíça. Provavelmente não teria acontecido tão cedo sem a Covid-19 como rastilho.

“A pandemia precipitou uma situação que eu só esperava ver daqui a 20 ou 30 anos: igrejas vazias, às quais muitos dos fiéis não voltam, e um catolicismo que muitas vezes já não «diz» nada às pessoas”, explica o Bispo Charles Morerod, líder desta diocese de maioria francófona com pouco mais de 700.000 membros.

“Não quero que o meu sucessor possa repreender-me porque me contentava apenas em preencher as lacunas, apesar de estar a ver o que estava a acontecer. Isso não seria responsável”, disse D. Morerod, um teólogo dominicano de 59 anos que foi reitor da Pontifícia Universidade de São Tomás em Roma, antes de ser nomeado Bispo de LGF em 2011.

Conhecido por tomar medidas decisivas para lidar com a crise dos abusos sexuais da Igreja, não tinha uma reputação de vanguarda quando se tratava de outras coisas. Mas o Bispo surpreendeu muitas pessoas em Maio passado, quando revelou uma reorganização da diocese que continua a descrever como um “salto de fé”. Em suma, alterou as estruturas diocesanas para melhor se adequarem à realidade da prática religiosa na Suíça francófona e deu responsabilidades de governo sem precedentes a certos membros do laicado católico que não parecem ter pressa em tirar férias de Verão.

“Há muitas coisas para iniciarmos se quisermos fazer as coisas descolarem no Outono “, explica Michel Ralcoz, que está a almoçar numa esplanada em Lausanne, entre dois aguaceiros.

 

Um leigo experiente em Vaud

Ralcoz, que tem cerca de 50 anos, é casado, tem três filhos e trabalha para a diocese de LGF (uma das seis na Suíça) há 26 anos.

No início de Setembro, começará uma nomeação de cinco anos como representante oficial do Bispo no cantão de Vaud.

Esta é uma nomeação excepcional, já que este cargo foi sempre ocupado por um sacerdote com o título de “Vigário Episcopal”.

Christophe Godel, o padre que actualmente está a terminar a nomeação, não parece nada infeliz por agora ser pastor de uma paróquia de montanha de mil metros de altura com vista para as águas do Lago de Neuchâtel.

Racloz, que assume o lugar de Godel como um dos colaboradores mais próximos do Bispo Morerod, afirma que a movimentação é “audaciosa, até profética”.

A nomeação do leigo, aprovada por Roma, foi anunciada no final de Maio. Racloz diz que está bem ciente de que o seu novo trabalho envolve riscos.

Sabe que precisará de ter cuidado para não se tornar um “leigo clericalizado”, cedendo ao autoritarismo. E terá que se relacionar com os padres de quem será o superior hierárquico sem partilhar o seu estado de vida; alguns já esperam que ele seja “como um pai” para eles.

Racloz serviu nove anos como delegado do Vigário Episcopal, durante os quais aprendeu a dominar questões técnicas, bem como a lidar com conflitos.

 

Duas mulheres em Friburgo

Enquanto o cantão de Genebra irá manter, por enquanto, um padre como Vigário Episcopal, um diácono permanente, Romuald Babey, irá tornar-se “representante do Bispo” neste Outono no cantão de Neuchâtel.

Quanto ao cantão bilingue de Friburgo, duas mulheres casadas serão as representantes oficiais do Bispo Morerod.

Céline Ruffieux, de 48 anos, irá trabalhar com católicos de língua francesa na área e Marianne Pohl-Henzen, de 61, irá lidar com aqueles que falam alemão, algo já fez nos últimos anos como “delegada episcopal”.

Nenhuma das mulheres defende a ordenação de mulheres, nem vê qualquer “oposição entre padres e leigos”. Em vez disso, procuram promover a complementaridade entre os diferentes estados de vida e favorecer estruturas eclesiais mais sintonizadas com a sociedade e representativas do “povo de Deus”.

Ruffieux diz que, depois de a sua nomeação ter sido anunciada, um dos padres em Friburgo prometeu que trabalharia com ela. Mas também confessou que “não aprovava” a decisão do Bispo de colocar uma mulher no cargo, acreditando que a hierarquia diocesana deveria ser reservada aos ministros ordenados.

Ruffieux, que é psicóloga e professora, diz que está a tentar ser compreensiva.

“Há medos, é claro, porque nos deparamos com um vazio. Não temos realmente um modelo a seguir; cabe-nos construir essa nova realidade”, insiste.

 

Uma cultura de participação

Como é que esta “nova realidade” para a Igreja Católica teve origem na Suíça, que geralmente é vista como mais discreta e menos aberta do que a Igreja nas vizinhas Alemanha e França?

Os alemães, que embarcaram num caminho sinodal que levou a exigências por mudanças eclesiais progressivas, influenciaram os suíços?

O Bispo Morerod nega-o, dizendo que o modelo alemão às vezes o deixa “um bocado perplexo”. Em vez disso, os observadores vêem os desenvolvimentos recentes na diocese de LGF como parte de uma cultura de participação profundamente enraizada na Suíça e no protestantismo, que é omnipresente nesta parte do país adoptado por João Calvino.

Nos últimos 15 anos, alguns leigos na Diocese de Lausanne, Genebra e Friburgo já fizeram parte de equipas responsáveis ​​pelas unidades pastorais (agrupamentos paroquiais).

São também responsáveis ​​pelas federações encarregadas de fazer a ligação entre a Igreja e o Estado, o que contribui – diferentemente, dependendo do cantão – para o financiamento do trabalho pastoral e da adoração.

O Bispo Morerod disse que gostaria de ver todos os baptizados a participarem mais plenamente na vida da Igreja.

Em particular, apoia a Rede de Mulheres na Igreja, que está activa na Suíça desde 2019. Mas não esconde o facto de as suas recentes decisões também terem sido motivadas por considerações mais pragmáticas.

Por exemplo, agora vê os seus padres mais competentes “a fazerem trabalho como padres”; isto é, a “desenvolver unidades pastorais em vez lhes de serem atribuídas tarefas organizacionais”. A implicação, claro, é que este não é o caso quando os padres servem como Vigários Episcopais.

 

Uma “experiência” para exportar?

Essas “unidades pastorais” são precisamente um dos elementos da reorganização em curso. Diante do declínio da prática religiosa, a Igreja local pretende desistir de cobrir todo o território em favor de ilhas que se tornaram "inevitáveis", segundo D. Morerod.

No final de 2020, o Bispo declarou publicamente que a sua diocese já não precisava de tantos padres estrangeiros, um movimento que irritou algumas pessoas.

Em todo o caso, os católicos da diocese terão a oportunidade de melhor se adaptarem – e estenderem – a essas mudanças durante um processo sinodal que irá começar no Outono.

Também no Outono, a fase diocesana da próxima assembleia do Sínodo dos Bispos sobre a sinodalidade terá início em toda a Igreja universal.

O Bispo acredita que essa coincidência provavelmente irá incentivar muitos católicos da diocese a envolverem-se neste processo local.

Será que essas experiências serão “exportáveis” para outros lugares?

Todos reconhecem que tais mudanças, especialmente a contratação de mais leigos, requerem recursos financeiros. E embora a diocese de Lausanne, Genebra e Friburgo não seja a mais rica da Suíça, tem mais recursos do que a maioria das dioceses em muitas outras partes do mundo.

Artigo de Mélinée Le Priol, publicado no La Croix International, a 29 de Julho de 2021.