Arquidiocese de Braga -

26 julho 2022

Papa reforça pedido de perdão a indígenas no Canadá

Fotografia Ian Willms/The New York Times

DACS com NYTimes/Ecclesia

Francisco pediu perdão pelo envolvimento de católicos em escolas onde crianças nativas foram forçadas a assimilação cultural, muitas foram sexual ou fisicamente abusadas e morreram.

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O Papa Francisco reforçou esta segunda-feira o pedido de perdão aos povos indígenas do Canadá, num encontro perto do local de uma antiga escola residencial em Maskwacis, na província de Alberta, durante o segundo dia da peregrinação penitencial”.

“Humildemente suplico perdão pelo mal cometido por tantos cristãos contra os povos indígenas”, disse Francisco para uma multidão de indígenas, alguns vestidos de forma tradicional e a usar cocares na cabeça, num círculo pow wow, um círculo coberto à volta de um espaço aberto utilizado para danças tradicionais. 

O Santo Padre acrescentou que as suas palavras são dirigidas a “todas as comunidades e pessoas nativas” e afirmou que um sentimento de vergonha tinha permanecido desde que pediu perdão a representantes de povos indígenas em Abril, no Vaticano.

Antes do discurso, o pontífice visitou um cemitério onde os indígenas locais acreditam que crianças foram enterradas em sepulturas anónimas. Francisco declarou que estava “profundamente desolado” – palavras que receberam aplausos e gritos de aprovação – pela forma como “muitos cristãos apoiaram a mentalidade dos poderes que oprimiram os povos indígenas”.

“Peço perdão, em particular, pelas formas como muitos membros da Igreja e de comunidades religiosas cooperaram, até pela indiferença, em projectos de destruição cultural e assimilação forçada promovidos pelos governos daquele tempo, o que culminou no sistema de escolas residenciais”, acrescentou o Papa.

Na visita à igreja do Coração de Jesus, em Edmonton, paróquia nacional das Primeiras Nações, Métis e Inuítes, o líder da Igreja Católica sublinhou que esta viagem ao Canadá é assumida como uma “peregrinação penitencial” para recordar “o mal sofrido pelas populações indígenas, da parte de tantos cristãos, e pedir perdão, com dor”, apontando que, “graças a Deus, através do encontro em paróquias como esta, edificam-se dia após dia as bases para a cura e a reconciliação”.

O Papa destacou que a Igreja deve ser uma casa “aberta e inclusiva”, onde “a hospitalidade e o acolhimento – valores típicos da cultura indígena – são essenciais”, e alertou que, “enquanto Deus se limita humildemente a propor-se, nós temos sempre a tentação de o impor e de nos impormos em seu nome”.

Numa igreja com várias peças de arte sacra elaboradas por indígenas, Francisco destacou a simbologia da árvore, com “um tronco que une ao terreno o altar”, e lembrou que “as populações indígenas atribuem um forte significado cósmico aos pontos cardeais, vistos não só como pontos de referência geográfica, mas também como dimensões que abraçam a realidade inteira e indicam o caminho para a curar”.

O Papa usou ainda a imagem da tenda indígena – tipi –, colocando-a em ligação com a simbologia bíblica: “Deus ergue a sua tenda entre nós, acompanha-nos ao longo dos nossos desertos: não habita em palácios celestes, mas na nossa Igreja, desejando que ela seja casa de reconciliação”.

A viagem, entre 24 e 30 de Julho, passa pelas cidades de Edmonton, Quebeque e Iqaluit – que abriga o maior número de inuítes, os membros da nação indígena esquimó.

Em 2021 foram descobertas mais de um milhar de sepulturas anónimas junto de antigas escolas residenciais indígenas, com 751 sepulturas anónimas a serem descobertas perto de uma única escola em Saskatchewan. Várias destas instituições pertenciam à rede de escolas administrada pela Igreja Católica e eram destinadas à “re-educação” de crianças indígenas, com o apoio do governo canadiano.

Nos séculos XIX e XX, até aos anos 1990, mais de 150 mil crianças indígenas passaram por este sistema de 139 instituições pelo Canadá. Em alguns casos, as crianças eram forçadas a ir para colégios internos para serem assimiladas pela sociedade caucasiana do país.

No final de Setembro de 2021, a Conferência Episcopal do Canadá publicou um “pedido inequívoco de desculpas” aos povos indígenas do território.

Os bispos canadianos reconheceram “os graves abusos cometidos por alguns membros” da comunidade católica, abusos estes “físicos, psicológicos, emocionais, espirituais, culturais e sexuais”, para além de reconhecer “com tristeza, o trauma histórico e contínuo, bem como o legado de sofrimento e os desafios que perduram até hoje para os povos indígenas”.

A Igreja Católica no Canadá admitiu que o sistema implementado nestes internatos, nos séculos XIX e XX, “levou à supressão das línguas, cultura e espiritualidade autóctones, sem respeitar a rica história, tradições e sabedoria dos povos indígenas”, e assumiu o compromisso de promover uma arrecadação de fundos em todas as regiões do Canadá para apoiar “iniciativas assumidas localmente com os parceiros indígenas”.

Em 2015, após sete anos de investigação, a Comissão de Verdade e Reconciliação do Canadá divulgou um relatório sobre escolas residenciais, revelando que entre 1890 e 1996 mais de 3 mil crianças morreram por causa de doenças, fome, frio e outros motivos.