Arquidiocese de Braga -

6 outubro 2025

Sofia Salgado: “não é surpresa haver resistência” ao Sínodo

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Rede Sinodal

No episódio 9 do podcast “No coração da esperança” da Rede Sinodal em Portugal, a gestora e docente universitária assinala que no Sínodo “há quem poderia fazer mais e não faz”

“No coração da esperança” é o nome da iniciativa em podcast da Rede Sinodal em Portugal. Apresentamos aqui o episódio numero 9 de uma parceria inovadora de comunicação que faz caminhar em conjunto Diário do Minho, Voz Portucalense, Correio do Vouga, Correio de Coimbra, A Guarda, 7Margens, Rede Mundial de Oração do Papa e Folha do Domingo.

Desta vez a entrevistada é a gestora Sofia Salgado que nos apresenta a sua reflexão sobre o processo sinodal iniciado pelo Papa Francisco, que entra agora na fase de implementação global com o Papa Leão XIV.

Que leitura faz do documento "Pistas para a implementação do Sínodo" publicado pela Secretaria Geral do Sínodo?

Vejo o documento como oportuno e como oportunidade. Oportuno no sentido do momento, e também de oportunidade e de guia. Oportuno, e quando eu digo momento, porque de facto é o documento que nos faz a ligação entre dois Papas. Em que este Papa vem ligar, vem continuar aquilo que tinha sido iniciado, e já com grande parte executada pelo Papa Francisco. E este é o documento em que o Papa Leão XIV nos diz: Isto é para continuar. E temos agora aqui uma janela temporal para o fazer. Por isso, e eu digo oportuno no sentido que nos dá um guia de ação, que depois dá-nos pistas de como fazer, e a quem é que é dirigido, e tudo que lá está no documento. Mas para mim é um documento que é importante porque ele é um sinal da vontade da continuação do processo. 

E, desde logo, é essa a primeira leitura que faço. E depois, não entrando se é novo ou não é, naquilo que são as pistas, dá-nos esse guia. E retenho algumas, uma ou outra que retenho, e que para mim são importantes. Desde logo, em insistir - aqui não é novo - na inclusão. Temos que incluir neste processo. Não é repetir aquilo que já foi feito, mas nas etapas que agora se seguem, e naquilo que se vai fazer, incluir aqueles que estão à margem, aqueles que não foram incluídos, porque isto não é para os mesmos. Isto é para refletirmos sobre a Igreja e as estruturas que queremos. E, por isso, costumo dizer, e digo isto também aos meus alunos e às pessoas com quem trabalho: Se nós fizermos tudo igual, não vamos esperar que as coisas se alterem. Por isso, há aqui uma clareza e uma clarividência no documento, que é: Temos que incluir, temos que escutar outros e temos que incluir aqueles que queremos incluir na Igreja. Aqueles todos que nós queremos incluir na Igreja, desde logo. E aqueles que estão à margem. Aqueles que não sabem se querem ser incluídos. Mas nós devemos escutá-los. 

Essa é uma primeira nota. Uma segunda nota é o estarmos conscientes da diversidade. Nós não vamos ouvir, nem trabalhar, com aqueles que são iguais a nós. Nós estamos com aqueles que são diferentes, porque aí é a riqueza do mundo e da Igreja. E a harmonia e a paz consegue-se nessa diversidade. Somos todos iguais. Eu nem acredito que haja muita possibilidade de harmonia, porque não há complementaridade. E, por isso, se nós vamos esperar por escutar aqueles que nos dizem aquilo que nós queremos ouvir, não vamos, eu diria, recolher muito sobre isso. Nem vamos crescer, nem amadurecer, nem evoluir com isso. Por isso, essa é outra nota que é, para mim, muito clara, muito repetida. A diversidade, a riqueza da diversidade, e a harmonia que se quer nessa complementaridade. E a Igreja constrói-se nessa diversidade. E depois a outra nota, que tem a ver com a partilha que se deve fazer das iniciativas. Nós não caminhamos sozinhos, e ninguém está a caminhar neste processo sinodal sozinho. Como ninguém se salva sozinho, ninguém deve caminhar sozinho. E aqui, devemos arranjar formas de partilhar daquilo que vai sendo feito. Por outros diferentes, por outros contextos, por outras culturas. Pelo nosso vizinho do lado, pela paróquia muito próxima, ou por outra mais distante. Arranjar formas de perceber o que é que está a ser feito, porque escusamos de inventar aquilo que já foi inventado, e podemos, inspirando-nos naquilo que já foi feito e está a ser repetido, fazer igual, fazer parecido, fazer diferente. Mas podemos inspirar-nos nesta partilha.

A partir também da sua sensibilidade de gestora, que expectativas tem sobre a dinâmica sinodal global neste processo que vai desde 2025 a 2028?

Desde logo, como pessoa de fé que acredita no Espírito Santo e em Jesus Cristo, diria que tenho uma expectativa muito positiva. Tenho muita esperança de que algo de positivo vai resultar daqui, e positivo para a Igreja. Daquilo que conheço, também da experiência de vida, e daquilo que é a experiência de como se comportam as organizações em geral, sejam mais empresariais, sejam menos empresariais, e também daquilo que é a organização Igreja, que é conhecida como a organização mais antiga que existe, com tudo o que é o mérito de ser uma Igreja com 2000 anos, eu diria que não espero um processo fácil. Primeiro, um processo de longo prazo exige muita energia, muitos procedimentos, que é aquilo que nós vemos nos documentos, nos guias, nas pistas, em toda a dinâmica que é colocada para que o processo seja levado a cabo. Por isso, em toda a estrutura e processos. E, por isso, o que é que eu espero? Acredito e vejo que o processo está a ser levado a cabo de forma estruturada, o que ajuda a que ele consiga chegar a bom porto. Sempre muito reforçado na importância de, para além de tudo que é formal, procedimentos e estruturas, a oração estar lá. Aqui é a diferença para um processo que é feito à luz da fé, e com a fé e não só, diria, formal e organizacional. E isso, para quem acredita, faz a diferença. E, por isso, se não for feito com oração, e aquilo que é chamado o discernimento eclesial, e outros. E tudo o que... Se não for feito assim, eu diria que vai ser muito difícil. Mas aqui a oração não pode estar fora disto, nem a individual, nem a, vou-lhe chamar a de conjunto e de comunidade. Considerando, como eu estava a dizer, a parte formal, e considerando que isto é feito, não é sozinhos, mas iluminados pelo Espírito Santo, tenho muita esperança naquilo que daqui vai resultar. 

Agora, como eu disse, é um processo longo. E num processo longo, e à escala a que ele é levado a cabo, há muita resistência. Não é surpresa haver resistência. Não é surpresa ver que há quem poderia fazer mais e não faz. Mas há esperança de que aparecem atores, e aparecem iniciativas onde nós não contávamos, porque o Espírito Santo não sopra onde nós queremos, onde nós esperamos. Sopra onde nós nem imaginamos, e da forma que nem imaginamos. E por isso aqui só pode resultar em coisa boa. Deixa-me acrescentar também a minha experiência no âmbito da Comissão Diocesana para o Diálogo Inter-religioso, onde temos feito, ao longo dos anos, um trabalho de escuta, de conhecimento e de diálogo. E acrescentar esta experiência, porque quando eu penso no processo sinodal, e sempre... Quer dizer, quer quanto estive envolvida, mais envolvida no processo sinodal, quer quando olho para os documentos, a dimensão da importância de alimentar o diálogo inter-religioso, e por outro a minha experiência desta… Como é que se diz? De fazer este diálogo, de o promover, é exatamente aquilo que eu vejo, que é um caminho sinodal. Porque nós não promovemos diálogo por decreto. Nós não fazemos algo, que dizemos “isto vai acontecer hoje”, e acontece. Isto exige escuta, exige vários momentos de encontro, exige ir visitar o outro, ir visitar a outra comunidade, e perceber como é que celebram a fé, perceber como é que se juntam. Perceber que hábitos têm de celebração e de estar em conjunto. E convidar também para a nossa comunidade. E precisamos de fazer isto várias vezes para perceber o que é que é específico do outro. E só conhecendo é que depois é possível ter diálogo. Por isso, para mim, a experiência que eu tenho tido no diálogo inter-religioso é a experiência daquilo que eu vejo que o Sínodo também promove. E por isso acho que é um bom exemplo.

Sobre a implementação do Sínodo em Portugal, acha que seria útil uma estratégia nacional? Que papel poderia ter a Rede Sinodal em Portugal?

Eu vejo muita vantagem em haver plataformas de partilha. Isso eu não tenho dúvidas. Naquilo que eu dizia, e que está nas pistas, que é: Nós temos que partilhar. Nós temos que ser… Há um lado da partilha, há um lado da transparência, e haver espaços de partilha e de discussão, sou totalmente a favor. Acho que a Rede Sinodal pode ter aí um papel muito importante. Quando entramos na lógica da estratégia, começamos a pensar quem é que define a estratégia, e quem é que vai andar a coordenar, e como é que vamos garantir que as respostas estão alinhadas com a estratégia. Ou então pode ser que terminologia não seja tanto ter uma estratégia. Ter uma plataforma de partilha, até de colaboração, onde nós conseguimos ir buscar não só ideias, mas buscar que nos possa ajudar, implementar um determinado projeto ou outro. Isso acho… Acho que esse é o caminho. Ou esse deveria ser o caminho, porque quando eu penso em plataforma, e pode ser digital, ou não. Sendo que, hoje em dia, penso muito no digital. Quer dizer, a tecnologia está ao serviço do Homem para o Homem fazer mais, e aí permite-lhe ir buscar, se calhar... Nós, se pensarmos nacional, daqui ao Sul, ou à ilha, a alguém que tenha uma iniciativa, uma competência específica que me ajuda a mim, que estou em Monção ou em Mirandela, e que de outra forma não chego lá. E por isso aqui, sair um bocadinho da fronteira… Sair, não é um bocadinho, sair da fronteira da Diocese, neste sentido, acho que só temos a ganhar. Sem receio. E aí não entrava na lógica de “estamos a ajuizar”. Não. Estamos é a colaborar, estamos a partilhar, estamos a inspirar. Temos aqui um sítio onde se pode fazer depósito, se quiser, de experiências e de partilhas. De competências, que nos podem chamar para ajudar noutras coisas. E aí não tenho dúvidas que a Rede Sinodal é e pode ser de muito valor acrescentado.

Sofia Salgado é gestora e docente na Universidade Católica Portuguesa. Pertence à Rede Sinodal em Portugal colaborando na iniciativa “No coração da esperança”, uma parceria com Diário do Minho, Voz Portucalense, Correio do Vouga, Correio de Coimbra, A Guarda, 7Margens, Rede Mundial de Oração do Papa e Folha do Domingo.