Arquidiocese de Braga -

30 setembro 2025

Opinião

Que beleza nos salvará?

Pe. Pedro Fraga

A propósito do novo altar, o novo ambão e a nova cadeira da presidência da igreja paroquial de S. Miguel-o-Anjo de Argivai


1.   “ Não me toques” Eis a expressão dita pelo o Ressuscitado, a quando da sua aparição a Maria Madalena. Todavia, porque esta proibição? Será o seu corpo intangível? Será a sua condição algo mítica, que não possa ser um lugar em nós? Nancy, filósofo francês, dedicou uma obra a explicação deste episódio do Evangelho de João, na qual afirmava: “que o mais importante não está na impossibilidade do toque de Maria Madalena, mas no deixar-se tocar”.

2.    Que tradição queremos manter viva? Que festa da insignificância (Milan Kundera) queremos cultivar? Nietzsche escrevia: «Quanto mais nos elevamos, menores parecemos aos olhos daqueles que não sabem voar».  Na realidade, o documentos conciliares, dizerem pouco acerca da igreja-edifício, mas dizem muito acerca do novo modo como a Igreja se compreende a si mesma: «uma Igreja de “comunhão”, mais sinodal, menos hierarquia, menos clerical”». Voltaremos a sustentar esta divisão?

Por sinal, é aqui, neste âmago, neste centro nuclear, que Cristo abre-nos as escrituras e apresenta o seu corpo e o seu sangue como uma narrativa viva, já que a  «a beleza principal da igreja, são as suas pedras vivas, que são as pessoas. Há uma beleza própria na comunidade».

4.   “Não me toques”. Será o nosso trabalho conservar uma verdade, e ditá-la sem querer juntá-la a um hábito criativo? Não poderemos ler os sinais dos tempos? Que rubicão teremos de passar, para que o cristianismo se torne um lugar de comunicação, um lugar de encontro, na qual é capaz de uma hermenêutica sapiencial da existência dos humanos e do seu tempo, tal como nos afirmado no evangelho: «Deste modo cumpria-se o que fora anunciado pelo profeta: Abrirei em parábolas a minha boca e proclamarei coisas ocultas desde a criação do mundo» (Mt 13,35).

5.   Assim, Deus não é um contraponto, mas algo que se aprofunda na nossa humanidade, e nos permite que « o visível tenha sabor e consistência». Ou seja, o invisível  a que chamamos Deus é sempre uma  «transparência,  que está sempre a ver-se, a mostrar-se, sem nunca O podemos alcançar, ao mesmo tempo que se torna  na profundidade pelo modo como esse mistério é tocado, evocado, e pela disposição afetiva que abre o ver, crer e o tocar».

6.   Kant o filósofo do iluminismo dizia que o mais importante era termos imaginação! Ousa pensar! Que beleza nos salvará? Que germinação inaugural nos atravessa?

Por isso, dentro deste íntimo, eis o eco de lugar, do espaço, onde Deus se faz passagem, vestígio, tal como Rui Chafes reforça: «Numa obra de arte é tão importante aquilo que se vê como aquilo que não se vê. Às vezes, até é mais importante aquilo que não se vê, porque uma obra de arte é apenas um fragmento de uma multidão de coisas que estão lá para trás e que não estão visíveis.»