Arquidiocese de Braga -

24 abril 2025

Opinião

Franciscus

Carla Rodrigues

Morreu-nos o Papa. O Papa da empatia, da mudança, da coragem e do riso fácil. O Papa da esperança, da simplicidade, da inclusão e da sabedoria. O Papa admirado por crentes e não crentes, de todas as faixas etárias e condições sociais. O Papa que viveu para servir. 

Hoje, cada um de nós chora a sua morte. A morte de um líder que soube impor-se, desde o primeiro segundo do seu pontificado, não pela força, muito menos pelo medo ou pela ignorância do povo. Liderou pelo exemplo, pela humildade, pela bondade, pelo sentido de justiça, pelo toque, pelo olhar e pelas palavras carregadas de ternura e sensatez. Liderou-nos com amor e por amor.

Com o seu olhar sempre atento e o coração debruçado sobre os que vivem nas periferias da sociedade, interveio, frequentemente, em defesa das minorias, dos vulneráveis e desfavorecidos, dos pobres, dos reclusos, dos explorados e dos excluídos. Basta lembrar a sua visita à Ilha de Lampedusa, na Itália, expondo o drama vivido pelos migrantes, a cerimónia de lavar os pés aos reclusos, as suas intervenções púbicas em defesa da paz, a sua bênção aos divorciados e recasados, incluindo as uniões entre pessoas do mesmo sexo, a valorização do papel das mulheres na Igreja defendendo que “são as mulheres que levam o mundo adiante”. 

Francisco deixou a sua marca de comunhão, defendendo que na Igreja cabem “todos, todos, todos”. Na verdade, sempre couberam, mas a cegueira não permitia ver, o medo não permitia falar e a cobardia não permitia defender. Mas, aquele Homem, vestido de branco, que os cardeais foram buscar ao “fim do mundo”, como gostava de dizer, despertou a atenção mundial para as periferias, falou de amor, cuidado e proteção como quem ensina um filho a falar, ajudando a erguer um mundo mais belo, mais dócil, mais tolerante e mais bem-humorado.

O seu maior legado é o amor! E é a percorrer as páginas deste amor que, de imediato, encontramos a sua luta incansável contra a monstruosidade dos abusos sexuais dentro da Igreja Católica.

Herdou este terrível dossier, que já vinha dos seus antecessores, mas de forma destemida promoveu mudanças profundas nas estruturas e normas da Igreja, desde a criação da Comissão para a Tutela dos Menores, o reforço da política de tolerância zero, a responsabilização dos bispos pelo encobrimento dos abusos, a abolição do segredo pontifício e a obrigatoriedade de denúncia. Em 2019, convocou uma Cimeira, com os presidentes de todas as conferências episcopais do mundo, sob o tema “A proteção dos menores na Igreja”, definindo as diretrizes internacionais para o combate aos abusos, defendendo que o abuso, em todas as suas formas, é inaceitável, mas o abuso sexual de crianças é particularmente grave, porque ofende a vida no seu crescimento. 

No caminho de proximidade e cuidado que foi construindo, Francisco defendeu que ouvir as vítimas é uma prioridade, e numa agenda repleta, sempre conseguiu encontrar tempo para parar e escutar as vítimas, rezar a sua dor e pedir perdão. Cabe-nos a nós, agora, agradecer o tanto que nos ensinou, o tanto que nos amou, e dar continuidade ao seu legado, respondendo positivamente ao seu apelo de integrar a proteção de menores na cultura das comunidades católicas, sem reduzir a uma resposta de emergência. 

“Há homens que, pelos atos, transcendem o humano tornando a própria existência de Deus mais provável” (Pedro Abrunhosa)