Arquidiocese de Braga -

18 abril 2024

Opinião

Uma Escola Católica para todos, como expressão de uma “Igreja em saída”

O André (nome fictício) é um aluno que está a finalizar o ensino básico na Escola Pública. Vive com os avós maternos. Foi concebido e gestado na prisão. Não sabe quem é o seu pai e pouco sabe sobre a sua mãe. Vê-a de vez em quando, quando ela sai em precária.

De olhar desfocado e num desabafo resignado, conta-me a sua vida: a de um rapaz entregue a si próprio e à alienação do jogo online que lhe rouba a noite, o descanso e lhe anestesia o sentido de dever para com a escola.

Não o refere, mas facilmente se percebe que, para ele, as aulas são uma seca, uma tortura diária a que é obrigado a sujeitar-se. Talvez por isso, e apesar de todo o acompanhamento pelo Serviço de Psicologia e Orientação, de todas as estratégias elaboradas e aplicadas pelos professores, o André continua a não trazer o material necessário para as diferentes disciplinas, a não se envolver nas dinâmicas de aula e, como fruto da sua desmotivação, a obter um aproveitamento muito baixo. Não se comporta mal, nem faz barulho. Está de corpo presente.

Este aluno teria lugar numa escola católica portuguesa?

A pergunta é provocatória e a resposta não é taxativa, mas atrevo-me a dizer que muito dificilmente o André teria lugar numa das nossas escolas católicas, à exceção daquelas que recebem financiamento do Estado ao abrigo de Contrato de Associação.

Na verdade, a única razão compreensível que pode obstaculizar a frequência do André numa escola católica portuguesa, refere-se à incapacidade económica da sua família para comportar o valor das mensalidades, mesmo naquelas com Contrato Simples de apoio à família. O ensino particular, como qualquer outra atividade empresarial, tem de ser financeiramente sustentável, por isso, esta situação configura um problema de difícil resolução. De facto, as nossas escolas católicas encontram-se presas à condição económica das famílias, despovoando-se, à partida, de alunos provenientes de famílias com baixos rendimentos. E, geralmente, estes são aqueles que apresentam mais dificuldades de aprendizagem porque, em muitos casos, não existe no seu ambiente familiar e social uma base sólida para um apoio educativo devido e frutífero.

No entanto, nenhuma escola católica se deve resignar a este condicionalismo. Se a Escola é Católica, é universal, é “para todos, particularmente para os mais débeis”, tal como refere o n.º 22 da Instrução “A identidade da Escola Católica para uma cultura do diálogo” da Congregação para a Educação Católica, publicada em 2022, lembrando-nos que “a maior parte das instituições educativas escolares católicas surgiram como resposta às exigências das classes menos favorecidas do ponto de vista social e económico”. Por isso, mesmo com dificuldades, é preciso que cada escola procure caminhos novos que possam compatibilizar, tanto quanto possível, a frequência de alunos como o André com a sua sustentabilidade económica.

No que se refere a razões de motivação intrínseca ou de percurso escolar, que carregam o potencial de vir a interferir negativamente numa determinada média estabelecida de resultados ou no posicionamento nos rankings escolares, não podem justificar a não entrada do André numa escola católica. A este propósito, o Papa Francisco, alertou em 2019, através de vídeo mensagem aos participantes da Organização Internacional de Educação Católica (OIEC), para o perigo da “ditadura dos resultados”, que considera a pessoa como “um objeto de laboratório” desinteressando-se do seu crescimento integral.

Razões de natureza ideológica, religiosa ou de outra qualquer natureza, também não podem impedir o André ou qualquer outro aluno de a frequentar.

Hoje, a Escola Católica deve ser expressão de uma “Igreja em saída” sob pena de se transformar numa ilha (A identidade da Escola Católica para uma cultura do diálogo, n.º 72). Deve, também, ser uma escola inclusiva, uma vez que a inclusão “é parte integrante da mensagem salvífica cristã”, “um método de educação que aproxima os excluídos e os vulneráveis” (n.º 32), onde o André e o próprio Jesus encontram lugar (Cf. Mt 25,40).

Sérgio Cabral, professor de EMRC e membro do CMAB