Arquidiocese de Braga -

22 novembro 2023

“O caso” de Frei Bernardo de Vasconcelos:

Fotografia

Recordação dos 100 anos da sua vocação monacal e a carta a Dom António Coelho O.S.B.

\n

Nenhuma vocação religiosa, em bom rigor, tem uma data de nascimento, porque todas brotam do seio eterno de Deus, que antes de todos os séculos, desde a eternidade, elege dentre o seu povo algumas pessoas em particular para serem ministros ordenados e evangelizadores do Reino de Deus na história da humanidade. A vocação religiosa é, por isso, um mistério que só à luz do mistério pascal de Cristo se compreende e se esclarece. 

Mas se é, então, certo que a vocação provém de um tempo sem antes nem depois, desde o seio eterno de Deus, é igualmente vero que as experiências divinas precisam de uma certa mediação temporal para se revelarem e tornarem-se narrativa e cronografia. 

Vem isto a propósito de uma efeméride que concerne o jovem Frei Bernardo de Vasconcelos (1902-1932), monge poeta a quem os colegas de Coimbra amavam chamar “o Bernardo do Marvão”, nome pelo qual era conhecido nas vestes de bardo, natural de São Romão do Corgo, em Celorico de Basto, Arquidiocese de Braga, que a Igreja declarou Venerável e que, se Deus quiser (e quando quiser), será beatificado e canonizado.

Com efeito, relendo a sua apaixonante correspondência - qual romance de aventuras espirituais por caminhos austeros e iluminados ou autobiografia de uma alma em ascensão para Deus – é-nos dado a conhecer que a sua vocação se torna consciência e revelação precisamente num dia do mês de novembro de cem anos atrás, ou seja, em 1923. Comemoramos, por isso, neste mês de novembro, os 100 anos do nascimento da vocação do jovem poeta místico. 

O Frei Bernardo, curiosamente, sempre se referiu à “sua” vocação como “o meu caso” e da leitura da carta que escreveu à sua irmã desde Coimbra, em 7 de Dezembro de 1923, podemos conhecer a primeira vez que, timidamente, fala já de vocação ao sacerdócio e/ou vida religiosa:

“Um dia desabafei com o N., alma grande e belo espírito de pensador -- poderei assim dizer. E a ele afigurou-se-lhe clara e evidente - e única - uma solução que sempre me sorria, mas que nunca tive coragem de encarar de frente. Só o ele dizer-me o que pensava me fez imenso bem e pareceu-me na verdade que se iluminava o meu caminho. Ficou desde logo resolvido entre nós ir o N. expor o meu caso, tal qual eu lho contara, ao Dr. N. E qual não é o meu espanto e a minha alegria, quando o N. me traz a notícia da sua adesão em princípio ao que o mesmo N. pensara e me dissera! Resolvi por isso ir ter com o Dr. N. e expor-lhe mais detalhadamente a minha vida. 

E ele, em face do meu desgosto e pesar - muitas vezes manifestado - de não ter vocação religiosa, e da facilidade em guardar castidade (pedra de toque, segundo ele me disse) - declarou-me que me poderia abandonar sem receio à ideia de vir a ser sacerdote, pois lhe parecia não haver dúvidas sobre a minha vocação religiosa. Contei-lhe o facto de eu, no auge do entusiasmo do namoro, ter pensado - és testemunha disso - em ser religioso; disse-lhe que várias vezes duvidei - como de facto - da minha vocação; disse-lhe do desgosto que sempre sentia ao pensar que não teria vocação (o que ele me disse chamar-se vocação negativa, que é, só por si, insuficiente) ... contei-lhe, enfim, a minha vida que conheces. E passei a confessar-me semanalmente a ele e devo declarar-te que se abriu para mim um mundo novo. 

É com um íntimo júbilo, pois, que eu te venho trazer a boa nova. Agora, segundo ele, o mais urgente é a saúde. À ida para aí falarei ao .... sobre se poderei, em qualquer parte para onde vá, fazer o tratamento e terei de prever mesmo o caso de entrar em religião e da possibilidade de fazer o tratamento, uma vez lá; expor-lhe-ei enfim tudo para que ele se pronuncie conscientemente como é capaz e para que eu assim possa já ir destinando a minha vida.

Isto é tudo tão delicado que eu não posso já pronunciar-me sobre a vida que levarei amanhã, isto é, não posso ainda, por mim mesmo, precisar o lugar para onde deverei ir, e onde deverei ingressar nessa milícia sagrada. Não sei por isso se virei a ser padre secular, se religioso e, neste caso, se isto, se aquilo. 

Tenho a minha inclinação para esta última situação - religioso -, mas ainda não sei bem para que Ordem, embora tenha já também a minha inclinação para uma que estás talvez longe de supor. Mas - em suma -- o que está definitivamente (poderei bem dizê-lo, meu Deus?!) é o eu querer ir para sacerdote. Tudo o mais é ainda (e não pode deixar de ser, pois só há um mês incompleto tomei a tal decisão) muito incerto e quase só de simples inclinação, elemento insuficiente para tão grave e delicado assunto”.

Nos inícios de novembro de 1923, portanto, o jovem Bernardo, com 21 anos, toma a decisão de abandonar a vida académica, renunciando ao matrimónio, para enveredar pela vida religiosa e dedicar-se completamente a Deus, assumindo o risco “do caminho austero e iluminado” e fazendo seu o lema “a renúncia é o caminho”, versos que captaram a atenção e impressionaram o poeta Teixeira de Pascoais, como veremos na carta que tencionamos transcrever.

É muito interessante notar também as mediações humanas e a ajuda dos amigos neste processo, ou “caso vocacional”, do jovem Bernardo. Da correspondência podemos salientar quatro pessoas que jogaram um papel fundamental de confessores e mediadores da graça de Deus no Venerável que são: antes de mais, a sua irmã Bárbara para quem não tem segredos e a quem escreve esta primeira carta acima citada, e que o acompanhará até à morte como um anjo da guarda; o Presidente do Centro Académico da Democracia Cristã (CADC), José Augusto de Queirós Ribeiro Vaz Pinto (1903-1985), o primeiro a receber a confidência e que o irá confiar aos cuidados e enlevos do P. Dr. Gonçalves Cerejeira, futuro Cardeal Patriarca de Lisboa (1888-1976) que, ouvida a história deste intranquilo ser sedento de Absoluto, terá concluído com douta sabedoria e experiência de mestre espiritual dizendo-lhe que se “poderia abandonar sem receio à ideia de vir a ser sacerdote, pois lhe parecia não haver dúvidas sobre a minha vocação religiosa”; e o P. Dr. Luís Lopes de Melo (1885-1951), assistente eclesiástico do CADC, Prior da Sé Velha, à sombra da qual foi maturando a decisão de trocar a Universidade pelo Mosteiro, junto ao seu sacrário, “ensaiando o voo para o claustro”. Disse-lhe o Reverendo P. Lopes de Melo naquele colóquio onde lhe confessou que desejava ser sacerdote: “Só? “Penso que virei a ser religioso”, disse-lhe eu. “Para aí, sim”, respondeu o Prior da Sé Velha”. O mais difícil acabara, enfim, de ser superado: dar um nome àquela inquietação, àquela sede de Infinito, ao chamamento à santidade que o perseguia: ser padre na vida religiosa. 

Depois de ter tomado a decisão de seguir a vida religiosa, o jovem Bernardo parece ter recuperado uma alma nova. Numa carta de 23 de Dezembro de 1923 ao P. Dr. José Manuel Pereira dos Reis (que viria a falecer como oblato regular da Ordem de São Bento em 1960) diz-lhe que “toda a minha inclinação vai para os filhos de S. Bento”. 

Agora era necessário entrar em contacto com a Ordem, mas não era fácil. A Ordem beneditina, como todas as congregações religiosas radicadas em Portugal, vivia, naquele tempo, na clandestinidade. Confiscados os seus 22 mosteiros em 1834, por decreto liberal, oficialmente extinta, alguns monges esforçavam-se por mantê-la viva, não obstante as leis persecutórias. A incorporação possível era feita discretamente, indo os jovens receber formação no estrangeiro. Um monge português, formado na Bélgica, que era a alma dessa oculta atividade e bem conhecido no meio católico português, foi por alguém indicado ao jovem Bernardo. Chamava-se D. António Coelho e começava a notabilizar-se pelo seu apostolado em prol da restauração litúrgica. Foi a ele que o Venerável Bernardo decidiu escrever iniciando uma relação de uma intensidade espiritual de mestre e discípulo que nunca mais teve fim. 

Dom António Coelho, O.S.B., nasceu em Braga, na freguesia de São João do Souto, em 24 de Maio de 1892. Emitiu os votos monásticos em 27 de Janeiro de 1912 e foi ordenado sacerdote em 24 de Setembro de 1916. Foi para Samos, na Espanha, em Julho de 1922 e ali residiu até Dezembro de 1926, estando à frente da pequena comunidade portuguesa de Singeverga, que ali fazia os estudos. Foi Prior de Singeverga de 1926 até 1932, viveu na Falperra e Tibães, onde foi pároco de 1932 até 1938, regressando depois a Singeverga, para ali morrer em 20 de Dezembro de 1938.

Depois de conhecer o jovem Bernardo da Anunciada (era esse o seu nome depois da profissão religiosa) nunca mais o abandonou, nem depois da morte. É ele o principal organizador da fundamental obra “Vida de Amor”, uma autobiografia de Bernardo Vasconcelos preparada com os textos da imensa correspondência que o Venerável Frei Bernardo nos legou e no qual se revela toda a sua cruz e santidade. 

No centenário da revelação da sua vocação monacal aproveitamos a ocasião para colocar, uma vez mais, sob os refletores da luz da contemporaneidade a carta que um coração cheio de Deus e de inquietação espiritual escreveu ao monge beneditino Dom António Coelho, pedindo-lhe que o acolhesse nos claustros que farão dele uma “hóstia em sangue” para o Senhor.

Num mundo à deriva de sentido, indiferente e acostumado à violência e à guerra, só o amor se nos apresenta como inexplicável e incompreensível. O percurso humano e espiritual do Frei Bernardo de Vasconcelos, reconhecido pela Igreja como heroico e exemplar, é um hino à vida, à poesia e ao amor. Colocando no centro da sua existência o amor e a consagração a Deus, através da renúncia, da poesia e da santidade, o jovem Bernardo soube dizer sim à vida e ao Evangelho, como antídoto à indiferença que grassa e tenta a juventude de hoje. 

A beleza, a profundidade, o amor oblativo e a intensa comunhão espiritual com Deus, mesmo através da mais agónica prova de vida, são o melhor testamento e proposta que o Venerável Frei Bernardo de Vasconcelos tem para oferecer ao presente e aos jovens que, fartos de alinhar no pessimismo, relativismo e superficialidade global, ousam buscar “um caminho outro” para as suas vidas, uma via nova de fé, esperança e caridade, capaz de antecipar a primavera do Reino de Deus, que já está no meio de nós, impercetível, como uma semente, mas a rebentar, bela, como uma pequena flor de amendoeira. 

Eis aqui, então, a carta que o jovem Bernardo escreveu ao Dom Abade António Coelho:

 

“Uma voz lhe diz: vai ter com Ananias

Tomo a liberdade de me dirigir a V. R. para lhe expor, o melhor que puder, o que eu chamo -«o meu caso» -e para que sobre ele V. R. me diga o que julgar conveniente.

Tendo eu, no princípio deste ano lectivo (sou estudante em Coimbra), sofrido uma crise longa e profunda de desalento; e sendo esse abatimento moral acompanhado dum grande abatimento físico, acordei um dia fisicamente melhor e a lembrar-me não sei como do sacerdócio.

Seria tão bom, dizia eu, se tivesse vocação, dar-me todo a Deus Nosso Senhor! Mas não, eu não tenho vocação!

E ficava cheio de pesar! Senti então que a crise tomava outra orientação: - de desalento passava a haver luta. A ideia da vocação sacerdotal não me largava e eu ... se bem que a acarinhasse, fugia-lhe.

Em tal estado andava, que um dia desabafei com o Presidente [José Augusto de Queirós Ribeiro Vaz Pinto] do C. A. D. C. de Coimbra (eu sou o Vice-P.), expus-lhe todo o meu tormento e ele desde logo me declarou que, pela facilidade em ser casto, que lhe confessei, e pela tristeza que sentia ao lembrar-me que não tinha vocação para sacerdote, lhe parecia poder afirmar que em tudo isso estava uma prova da vocação que eu julgava não ter. E logo combinou comigo ir expor o caso ao Senhor Dr. N. [Manuel Gonçalves Cerejeira], virtuoso sacerdote, professor da Universidade de Coimbra.

E este disse-lhe que concordava em princípio com a sua opinião. Ao outro dia fui eu expor-lhe mais detalhadamente este «meu caso» e ele logo me permitiu que encarasse de frente a ideia do sacerdócio, dizendo-me que a primeira coisa a fazer seria tratar a valer da saúde.

Quero ainda contar a V. R. um pormenor interessante: - Há quase um ano acabei um namoro que tive e que durou perto dum ano. Dele dera parte a minha família, exceto a meu pai, e um dia, em férias, em pleno período do mais puro entusiasmo, tive durante dias a ideia de ir para sacerdote, o que minha mãe e uma de minhas irmãs (únicas pessoas a quem o disse então) aprovaram plenamente, dizendo que sempre julgaram ser esse o rumo que deveria tomar. E sabe V. R.? Eu gostava e não gostava .... Andava com tanta seriedade e com tal gosto que eu mesmo me compenetrava de que levaria tudo ao casamento. Mas tinha grande tristeza no fundo, e sentia sempre um vácuo imenso, que à força de me atormentar me venceu, até que um dia, com um grande desgosto que tive, terminei bruscamente tudo numa carta que, muito embora levasse as melhores e mais sinceras palavras, levou também um grande choque. Graças a Deus algum bem lhe fez a convivência comigo. Deus seja louvado por se ter dignado permiti-lo. 

- Tomada em Coimbra a resolução de vir a ser sacerdote, com a aprovação do Sr. Dr. N. [Manel Gonçalves Cerejeira] que passou a dirigir-me e do Sr. P. L. [Luís Lopes de Melo], nunca mais duvidei da minha vocação e todos os dias fazia na Sagrada Comunhão a promessa de ser fiel a tão grande graça. - Deus sabe que o não tenho cumprido inteiramente!... 

Mas agora trata-se de saber que lugar devo ocupar. E é sobre este ponto principalmente que eu peço a atenção de V. R., pois o julgo bem delicado e tenho desejo de, com a ajuda de Deus, Nosso Senhor, o resolver o melhor possível. 

Lembrava-se o Sr. Vice-Reitor do Seminário de ... a quem o Sr. Dr. N. falou, de que eu poderia concluir o curso de Direito e tirar depois o de Teologia para assim ter mais uma carta comprovativa de estudos necessários para ficar em qualquer lugar como simples sacerdote. Mas, porque estou ainda no 1.° ano de Direito e porque sinto o desejo de entrar o mais depressa possível no meu caminho, desde logo declarei que não me sorria tal solução. Lembrou-me o Sr. Dr. um curso de Teologia em Roma, mas ... Há ainda um mas ... que eu não sei dizer mesmo qual seja.

E toda a minha inclinação vai para os filhos de S. Bento. A traços largos conhecia eu a sua vida quando tal inclinação se despertou em mim. Posso mesmo dizer que desde o dia em que o sacerdócio passou a ser o meu ideal, logo os meus olhos e, com eles, o meu coração, se dirigiram para a Ordem de S. Bento. O Sr. Dr. N. emprestou-me um belo livro histórico «Les Bénédictins», e ainda há pouco li, por indicação dele e recomendação do Sr. Dr. R., o interessante livro «Une journée chez les moines», que me satisfez quase inteiramente - e digo quase inteiramente no sentido de que me não falou, como eu desejava, da vida íntima dos noviços.

Li-o com um prazer e uma avidez indescritíveis e só tive pena de que me não permitissem que o trouxesse comigo para ler e saborear em férias.

O serem «uma pequena igreja»; a variedade de obras a que se dedicam, o que permite uma mais perfeita escolha de especialistas - e é ver a grandeza de tantos dos seus queridos nomes, no Papado, na Liturgia, nas Letras, nas Artes, nas Missões, etc.! --; a sua maneira especial (se é que assim posso dizer) de serem contemplativos; a sua feição eminentemente artística; um sem número de coisas, enfim, faz com que todas as minhas simpatias sejam para eles, os Filhos de S. Bento.

Em mil coisas pequeninas reconheço a necessidade dum jugo suave (há quanto tempo o desejava, lá de quando em quando!) e de me consagrar a Deus Nosso Senhor no recolhimento e apagamento duma cela. Os meus melhores e mais queridos amigos e que melhor me conhecem - são da mesma opinião. Um certo geito artístico que eu ponho por vezes nas coisitas que escrevo, e um acentuado misticismo. que esses escritos testemunham, contribuem também para que a minha inclinação seja essa.

E assim, dizendo eu um dia ao P. L. (de que falo atrás) que resolvera a minha crise com uma solução -o sacerdócio- ele perguntou-me imediatamente: - «Só?» E eu tive então de lhe dizer, embora a medo... - Tenho alimentado a esperança de vir a ser beneditino. E ele então, com o seu geito faceto, ripostou logo: «Eu bem dizia, de mim para mim: - S. Bento ainda há de caçar aquele Bernardo…»

E deu logo as razões que o levaram a pensar assim: “pequenas coisas exteriores e esse temperamentozito artista que por aí anda ...» 

- Tendo eu lido durante as férias grandes a «Vida o Obras de S. Francisco de Assis”, magistral trabalho do convertido Joergensen, concebi a ideia de fazer um livrito de versos (tenho escrito alguns de feição mística) intitulado «Cântico de Amor» e todo dedicado a Deus Nosso Senhor. Numa fase de transição para uma vida melhor, escrevi um soneto que tinha um terceto que impressionou o poeta Teixeira de Pascoais e um jovem poeta, meu amigo, e de que várias pessoas gostaram muito. 

 

A Renúncia é o caminho ... e tão custoso 

Que eu ergo as mãos pra Deus, aflito, ansioso, 

Num íntimo prenúncio de fraqueza. 

 

Aconselharam-me até que o tomasse para legenda, etc. 

Com bem pouco se impressionam os que vivem no mundo, o que prova bem a falta de amor de Deus de que enferma o nosso querido Portugal. - Esse livrito seria dividido em duas partes: «para as criancinhas» a primeira, e para «os rapazes da minha terra» a segunda. E quer V. R. saber? Não dedicaria soneto algum a ninguém. E o próprio livro seria dedicado só a Deus Nosso Senhor. 

Poucos sonetos tinha, porém, e não senti nunca saúde nem inspiração para o fazer e por isso não lhe toquei mais. Isto vem para dizer a V. R. o que eu sou, pois esta carta pretende ser, antes de tudo, uma revelação e é por isso mesmo que eu, pouco modestamente, venho falar de certas aptidões, para que, sentindo-me mais à vontade, mais facilmente possa abrir-me como desejo. 

Devo dizer a V. R. que o Sr. Dr. N. não só consentiu, mas até me aconselhou que pessoalmente me dirigisse a um «monge beneditino», uma vez que era manifesta a minha inclinação por essa Ordem.

Ele sempre me diz que ainda lhe não parece que eu deva abandonar-me inteiramente à ideia de vir a ser beneditino, pelo que me conhece, e que talvez por aqui ande bastante entusiasmo e muita poesia.

Porque reconheço em mim esse entusiasmo e esse geito de poetizar as coisas mais sérias, é que eu venho aqui roubar a V. R. alguns momentos hoje, e alguns outros amanhã talvez e depois, se a bondade de V. R. mo permitir e assim for por V. R. julgado conveniente e necessário.

Duas palavras que sejam de V. R. muito me poderão elucidar e talvez até Deus Nosso Senhor se digne mandar muita luz à minha alma por intermédio de V. R. que eu só tenho a honra de conhecer de nome, do livro «Liturgia» primeiro, e através do Dr. R. depois”.

 

Roma, 24 de Novembro de 2023, Solenidade de Cristo Rei

Mons. Mário Rui de Oliveira

Postulador