Arquidiocese de Braga -

12 setembro 2022

“A Igreja é muito maior do que as nossas ideias mesquinhas”

Fotografia DR

DACS com La Croix International

A Igreja sinodal, diversidade de membros e a unidade na Eucaristia.

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O Papa Francisco tem falado incessantemente sobre criar maior fraternidade entre todas as pessoas, mas especialmente na comunidade cristã.

No entanto, isto pode ser difícil entre gerações com abordagens e expectativas muito diferentes.

Como viver essa fraternidade entre católicos de diferentes gerações e tendências, quando os fiéis escolhem as suas paróquias de acordo com seus sentimentos, assim como nas redes sociais onde acabamos por lidar apenas com aqueles que participam nos mesmos círculos que nós?

Isabelle Payen de la Garanderie, teóloga e Virgem Consagrada que serve como Capelã Juvenil na Diocese de Nanterre, perto de Paris, acredita que a Eucaristia é o lugar para construir a unidade numa Igreja composta por tantos membros diversos.

Explicou como e porquê nesta entrevista com Clémence Houdaille do La Croix.

 

As quezílias geracionais que se observam na Igreja não se devem ao facto de nos esquecermos que “formamos o mesmo corpo”?

É uma tentação muito humana acreditar que somos melhores que as gerações mais velhas. Isto não é novidade, embora hoje vivamos numa sociedade muito fragmentada, com forte tendência para o individualismo. Isto faz-nos esquecer que nunca somos cristãos sozinhos, e que a Igreja é um “nós”, chamado por Cristo, um corpo que formamos e que nos devemos tornar cada vez mais, a cada Eucaristia. Cantamos: “Nós somos o corpo de Cristo”. Mas ajudamo-nos uns aos outros? Como fazer da nossa Eucaristia não lugares de passagem, mas lugares de fraternidade, onde tomamos consciência deste vínculo entre nós, lugares de encontro com Cristo que nos dá o seu corpo, para que, nutridos por Ele, encontremos o mundo?

 

O que implica este conceito da Igreja como corpo?

A Eucaristia é ao mesmo tempo lugar de diversidade e de unidade. A diversidade na Igreja deve ser acolhida nas nossas celebrações. Existe a tendência de querer que a Igreja se pareça connosco, e mesmo de fazer das nossas celebrações eucarísticas momentos de conflito, por vezes entre clérigos e leigos. Mas um corpo tem membros diferentes. Somos interdependentes uns dos outros, e São Paulo lembra-nos disso: “O olho não pode dizer à mão: «Não preciso de ti»”. Só porque alguém tem uma função diferente da minha, ou pensa de forma diferente de mim, isso significa que tal pessoa pertence menos à Igreja do que eu? A Igreja é muito maior do que as nossas ideias mesquinhas. Certamente, é importante ter pequenas comunidades fraternas de fé. Mas a participação na Missa dominical, com uma assembleia composta por pessoas às vezes completamente diferentes de nós mesmos, lembra-nos que somos parte do mesmo corpo de Cristo.

 

Quando as diferenças parecem irreconciliáveis, ainda podemos considerar que somos um só corpo? Algumas pessoas até pedem uma espécie de “amputação”, incitando os descontentes a irem embora...

Como é que alguém pode ser feliz quando alguém está em sofrimento? É um assunto sério dizer que aqueles que não estão felizes ou aqueles que nos magoam devem deixar a Igreja. É uma falha do impulso missionário, bem como do dever de cuidarmos uns dos outros. Todos nós temos algo a contribuir. Os mais velhos não são apenas a Igreja de ontem, os mais novos não são apenas a Igreja de amanhã... Isto não significa, porém, que devemos encontrar um consenso leve, ou fingir que concordamos com algo se não for o caso. Mas significa ouvir-nos uns aos outros, isto é, tornar-nos uma igreja sinodal. Isto envolve aprender a olhar para as feridas do corpo e curá-las. Henri de Lubac disse que a Igreja “ultrapassa misteriosamente os limites da sua própria visibilidade e transporta-se sempre, por assim dizer, em virtude da sua própria essência, para além de si mesma” (em A Igreja: Paradoxo e Mistério). Isto dá outra dimensão àqueles que gostariam de se limitar ao seu pequeno grupo. E mesmo aqueles que tendem a distanciar-se progressivamente da Igreja ainda estão ligados de uma forma sobre a qual não estamos necessariamente conscientes: alguém que continua a ir à Missa apesar de tudo, para receber o corpo de Cristo na palavra e na Eucaristia, existe também para nos converter e para nos ajudar a alcançar uma maior unidade.

Entrevista de Clémence Houdaille, publicada no La Croix International a 10 de Setembro de 2022.