Arquidiocese de Braga -

15 julho 2022

Irmã Livia Ciaramella: Uma freira na prisão para redescobrir o que se perdeu

Fotografia DR

DACS com Vatican News

Depois de uma passagem como missionária na Costa do Marfim, a Irmã Livia Ciaramella foi convidada a animar uma celebração eucarística numa prisão na Itália, e desde então não parou de servir os presos.

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Uma barra de sabão, um rolo de papel higiénico, uma almofada de espuma, lençóis, um prato: é tudo o que possuem os reclusos que a Ir. Livia conhece.

Ao olhar para o telefone antigo, diz: “Aqui está uma mensagem: uma esposa que está desesperada porque não sabe enviar as coisas para o marido, que foi preso no outro dia”. E continua: “Eles podem até ser pessoas extremamente ricas, mas uma vez que são presos e enviados para a prisão mais próxima, tudo o que têm são as roupas que estão a vestir e o kit da prisão”.

E é aí que ela entra: a Ir. Livia Ciaramella é líder dos programas de reabilitação da prisão de San Donato em Pescara, Itália. Nasceu na região de Abruzzo e é irmã religiosa da Congregação das Filhas dos Sagrados Corações de Jesus e Maria, fundada pela Madre Eugenia Ravasco.

Depois de servir como missionária na Costa do Marfim, em 2006, a Ir. Livia foi convidada a animar a celebração eucarística pelo então capelão da prisão, o padre Marco Pagniello, que hoje é director da Caritas Itália.

Não abandonou os presos desde então. “O momento mais difícil”, diz, “é quando chegam: a impressão da prisão, quando passam da comida caseira para a comida da prisão, quando não têm mais nada; perder a oportunidade de falar com eles, de ouvi-los naquele momento tão delicado, poderia ter consequências irreversíveis”.

A sua constante disponibilidade para ouvir e o seu olhar de amor incondicional apontam para um Amor ainda maior. De facto, há muitas iniciativas espirituais para os reclusos. Além da celebração eucarística e da possibilidade de se confessarem com o capelão, há ocasiões especiais durante o ano que a criatividade de Irmã Lívia transformou em intensos momentos de oração.

“Em Maio, coloquei um calendário em cada secção da prisão. Os reclusos inscrevem-se e eu entro nas suas celas para rezar o terço: anteontem, rezei em sete celas diferentes. Chego com uma imagem de Nossa Senhora de Fátima e rezamos todos juntos”.

Mas o seu trabalho é multifacetado: a Irmã Lívia acorda às cinco da manhã. Depois de rezar, pega nos lanches para os reclusos que são fornecidos por generosos benfeitores. Em seguida, segue para a prisão, onde realiza diferentes workshops todos os dias para que os reclusos possam usar as suas habilidades manuais, até mesmo confeccionar pequenos itens artesanais para serem vendidos em mercados beneficentes organizados pela Irmã Livia. A receita das vendas vai para a compra de itens necessários para os recém-chegados. Tudo é pensado para que os reclusos não percam a dignidade. “Encontro a pessoa”, diz a Ir. Lívia, “mas ao encontrar a pessoa, estou a trazer Jesus, para que a pessoa se sinta amada e não julgada”.

A experiência já lhe deu uma boa compreensão das leis do sistema penitenciário, e a Irmã Livia usa-as para dar aos reclusos a possibilidade de experimentar a verdadeira humanidade, porque um amor assim tão grande não pode ficar preso dentro dos muros da prisão. Há, de facto, várias iniciativas que a “freira de Ravasco” – como são frequentemente chamados os membros da sua Congregação – têm organizado com os reclusos mesmo fora da prisão.

“De acordo com o artigo 21, em colaboração com a Unitalsi, às vezes levamos alguns jovens para fazer serviço comunitário com os doentes em Pompéia ou Loreto. As suas tarefas incluem empurrar as cadeiras de rodas dos pacientes e ajudá-los com o que eles precisem”, explica.

Dá especial atenção à celebração eucarística, sempre preparada com muito cuidado: “De acordo com o artigo 17, em ocasiões especiais como o Natal e a Páscoa, quando o Arcebispo Tommaso Valentinetti de Pescara-Penne vem celebrar, convido alguns jovens a tocar vários instrumentos musicais, para deixar a Missa ainda mais bonita: temos um grupo litúrgico e todos os Domingos já sabemos quem vai ler e quem vai ser o responsável pelos diferentes ministérios”.

Há muitas histórias de sofrimento, muitas famílias desfeitas que encontram nesta religiosa uma âncora de salvação. E isso traz muitos frutos de diferentes maneiras. Entre eles está o mais belo de todos: “Às vezes as pessoas pedem-me para ensiná-las a rezar, muitas vezes esta é a pergunta-sintoma que me leva a perguntar se elas são baptizadas. Às vezes não são. E depois crio programas de preparação personalizados, além do catecismo de sábado, para que possam receber os sacramentos da iniciação cristã”.

Com a prisão a receber o nome de São Donato, a Irmã Livia até conseguiu colocar o santo na prisão. De facto, em 2018, a urna que contém as relíquias do santo chegou de Castiglione Messer Raimondo (província de Teramo, Itália) e foi trazida para dentro da prisão para um dia inteiro de oração e celebração eucarística.

A preocupação da Ir. Lvia obviamente estende-se ao que acontece depois de os presos serem libertados da prisão. É por isso que está em constante colaboração com a Comunità educanti con i carcerati (Comunidades Educativas de Prisioneiros), um projecto liderado pela Associação “Comunidade Papa João XXIII”, que se dedica à reabilitação de detidos.

“Quando saem da prisão, devem ser mais fortes do que anteriormente, caso contrário a prisão é reduzida a apenas manter as pessoas lá dentro”, conclui.

 

Artigo de Valentina Angelucci, publicado no Vatican News a 14 de Julho de 2022.