Arquidiocese de Braga -

15 março 2022

Violência contra as mulheres aumentou no Brasil durante pandemia

Fotografia

DACS com Crux

Pelo menos 1.319 mulheres foram mortas em 2021, uma ligeira diminuição em relação a 2020, quando 1.351 mulheres foram assassinadas.

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Uma mulher é violada a cada dez minutos no Brasil e uma é assassinada a cada sete horas, de acordo com uma relatório de estatísticas de crimes em 2021.

Relatórios policiais de todos os estados do Brasil recolhidos pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (BPSF) mostraram que houve 56.098 casos de violação no país sul-americano no ano passado, um aumento de 3,7% em relação ao ano anterior.

Pelo menos 1.319 mulheres foram mortas em 2021, uma ligeira diminuição em relação a 2020, quando 1.351 mulheres foram assassinadas.

O estudo também mostrou que houve um alto número de casos de violência contra as mulheres durante a pandemia de Covid-19. De Março de 2020 a Dezembro de 2021, 2.451 mulheres foram mortas e 100.398 casos de violação – com vítimas do sexo feminino, incluindo menores – foram registados.

Dados mensais mostraram que o número de mulheres assassinadas aumentou particularmente entre Fevereiro e Maio de 2020, quando as medidas de distanciamento social estavam a ser introduzidas devido à pandemia.

A maioria dos casos de violência contra a mulher envolve um conhecido, um parente ou um marido como perpetrador. Uma pesquisa anterior do BPSF mostrou que 89,9% de todos os assassinatos que envolveram vítimas do sexo feminino em 2019 foram cometidos pelo marido ou ex-marido da vítima. Apenas 2,6% dos crimes foram cometidos por um estranho.

“Antes da pandemia, os homens saíam de casa para trabalhar e depois iam a um bar encontrar-se com os amigos, jogavam futebol e assim por diante. Com a quarentena, tiveram que ficar em casa. Uma convivência mais próxima com as famílias resultou em mais violência”, disse a Irmã Ivone Gebara, Teóloga feminista de longa data e activista no Brasil.

“Até as crianças sofreram mais, sendo vítimas de violência e violação em casa”, acrescentou.

Isto é algo que as integrantes da Pastoral da Mulher da Região Episcopal da Brasilândia, na Arquidiocese de São Paulo, disseram observar no dia-a-dia do trabalho. Um bairro pobre da zona norte da cidade, a Vila Brasilândia sofreu não só com as medidas de distanciamento social, mas também com as consequências da crise económica criada pela pandemia, que provocou um alto desemprego.

“As mulheres permaneceram fechadas dentro das suas casas com seus agressores – principalmente os seus maridos, mas também um filho, um neto ou outro parente do sexo masculino”, disse Carmen Araújo Lisboa, integrante da Pastoral da Mulher, ao Crux.

O grupo ajuda mulheres que têm enfrentado violência doméstica, às vezes levando-as até para abrigos. Mas o principal papel do ministério é consciencializar as mulheres.

“O nosso objectivo é prevenir casos de violência doméstica e feminicídio. Temos que ajudar as mulheres a entender que são capazes de mudar a sua situação”, disse Lisboa.

Durante as reuniões, os membros do ministério da mulher discutem os problemas comuns que as mulheres do bairro enfrentam em casa e sugerem soluções. As mulheres são incentivadas a voltar à escola, e as actividades do grupo incluem formar mulheres para desenvolverem habilidades profissionais. A ideia é que elas possam gerar rendimentos para serem menos dependentes dos seus maridos e reequilibrar o poder no casamento.

Se a violência já está a acontecer, as mulheres são aconselhadas a tomar medidas legais. “Nesses casos, não se pode fingir que nada de errado está a acontecer apenas para manter o casamento. Mas realmente trabalhamos para evitar que as coisas cheguem a esse ponto”, disse Lisboa.

D. Ricardo Hoepers, do Rio Grande, que preside à Comissão Episcopal da Pastoral para a Vida e a Família da Conferência Episcopal, disse ao Crux que foi possível observar como a pandemia agravou as crises familiares já existentes.

“Entendemos que tais problemas são consequência de uma crise maior. As famílias foram desestruturadas por uma sociedade consumista em que as pessoas se tratam como objectos e pela relativização do amor, substituído por aventuras sexuais”, disse.

Hoepers disse que a sua comissão está a começar a trabalhar com as famílias nos estágios iniciais para formá-las de acordo com os princípios católicos.

“A nossa ideia é fazer com que as pessoas entendam o casamento como um processo de autoconhecimento, acompanhados por casais de catequistas capazes de ajudá-los a aprofundar  os seus laços”, explicou.

Um dos alvos dos ministérios da pastoral familiar deve ser o combate à misoginia, descrita por Hoepers como “o impulso de dominar o outro, que é considerado de alguma forma inferior”.

“A ideia de que a mulher é inferior ao homem não está na Bíblia. Jesus afirmou que têm igual dignidade”, disse.

Com a intervenção dos ministérios da pastoral familiar em diferentes regiões do país, as famílias devastadas pelo ódio e pela violência conseguiram reconstruir a confiança e o amor, afirmou Hoepers.

“A única maneira de lidar com estes problemas é oferecer às famílias uma experiência diferente daquela que o mundo proporciona. A igreja tem que ser a família das famílias”, acrescentou o bispo.

 

Artigo de Eduardo Campos Lima, publicado no Crux a 15 de Março de 2021.