Arquidiocese de Braga -
11 março 2022
“Livro de Missas” do séc. XVII em Miranda do Douro digitalizado pelo Boston College
Agência Lusa
Exemplar do "Livro de Missas, Magnificas e Motetes", de Diego de Bruceña, descoberto em 2015, é o único cuja existência está comprovada.
O Boston College, universidade privada jesuíta entre as melhores dos Estados Unidos da América, está a digitalizar o único exemplar sobrevivente do "Livro de Missas, Magnificas e Motetes", de Diego de Bruceña, impresso há 400 anos e descoberto na Concatedral de Miranda do Douro.
Dos 40 exemplares do "Livro de Missas, Magnificas e Motetes", de Diego de Bruceña, impressos em 1620, só está comprovada a existência do exemplar descoberto em 2015, em Miranda do Douro, o que despertou desde logo a curiosidade da comunidade musicológica internacional.
A directora do Museu Terra de Miranda, Celina Pinto, explicou à Agência Lusa que até 2015 “pensava-se que todas as composições de Bruceña estavam perdidas para sempre, mas a excepcional descoberta deste exemplar permitiu recuperar grande parte [da sua obra] de música sacra, do início do século XVII”.
O livro tem uma capa de madeira com 92 centímetros de largura e 60 de altura, e foi impresso na cidade de Salamanca, Espanha, pela “prodigiosa gravadora de música sacra Susana Muñoz”.
Esta "empreendedora mulher de negócios, através de sucessivos casamentos estratégicos, com figuras-chave da florescente atividade tipográfica de Salamanca", como Antonio Pérez e Artus Taberniel, manteve uma atividade constante entre 1602 e 1625, tendo impresso mais de 120 títulos de música sacra, um número recorde em relação a qualquer outra empresa ibérica, na Era Moderna, segundo os investigadores.
O exemplar sobrevivente tem 210 páginas, tendo sido identificada a perda de 80 o que impõe um trabalho minucioso de reconstituição musicológica, de modo a suprimir as partes musicais em falta.
As obras recolhidas, segundo os investigadores, apresentam texturas sonoras complexas, em termos melódicos e rítmicos, características da polifonia ibérica tardia, podendo congregar até 11 vozes.
A proximidade de Susana Muñoz a Pérez e Taberniel, e à importância da tradição flamenga da impressão, é "mais um aspeto que vem sublinhar a importante relação cultural entre Antuérpia e Miranda do Douro, mas é também um testemunho profundo da riquíssima vida musical da catedral no século XVII”, sublinhou a directora do museu.
O minucioso processo de estudo e digitalização a que o "Livro de Missas" está agora a ser submetido tem o objectivo da sua disponibilização à comunidade científica, assim como a músicos, intérpretes e público em geral.
O trabalho de digitalização está a ser coordenado pelo musicólogo e regente Michael Noone, responsável máximo pelo departamento de música do Boston College e especialista em música do Renascimento.
Michael Noone teve o primeiro contacto com o livro há cerca de três anos, quando visitou pela primeira vez a cidade de Miranda do Douro, por causa da obra em causa, e depressa percebeu que estava perante "uma pérola" da música sacra europeia.
“Esta era a peça que faltava de um conjunto de livros de música sacra impressos por Susana Muñoz, no início do século XVII”, disse agora o investigador, que explicou que a digitalização em curso obedece a critérios “de alta-definição", sendo "tiradas cerca de uma centena de fotos a cada página do livro".
De acordo com o investigador, o trabalho tem de ser concretizado no Museu da Terra de Miranda, já que era praticamente impossível deslocar este livro para Boston “dada a sua fragilidade”.
Um conjunto de obras deste único exemplar do livro de Bruceña vão ser interpretadas em Londres pelo agrupamento The Renaissance Singers of London, dirigido por David Allinson, especializado no repertório da Música Antiga.
Terminado o trabalho de digitalização, a Concatedral de Miranda do Douro acolherá igualmente um conjunto de concertos com base neste livro de 400 anos, para dar a conhecer uma expressão sofisticada da polifonia do seu tempo.
O trabalho dos especialistas da universidade de Boston decorre em colaboração com a Concatedral e o Museu da Terra de Miranda.
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