Arquidiocese de Braga -

10 março 2022

Refugiados daqui, migrantes dali

Fotografia Borja Sánchez Trillo/ EFE/ Newscom/ MaxPPP

DACS com La Croix International

A Europa abriu de bom grado as suas portas às famílias ucranianas que fogem do seu país, deixando um gosto amargo aos refugiados de guerra de outros continentes que nem sempre foram bem recebidos.

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A emoção provocada em toda a Europa pela visão de famílias ucranianas a fugirem do seu país é comovente. Mesmo que a onda de propostas para recebê-los deixe um gosto amargo.

O presidente da cidade francesa de Lyon explica, de mão no coração, que lhes irá disponibilizar alojamento. Afinal, havia alojamento gratuito em Lyon?

Assim como a empresa Airbnb, que forneceu 100.000 lares temporários a refugiados ucranianos. Paris, por sua vez, garante que pode encontrar “soluções de acomodação”. Então, as soluções já eram possíveis antes...

As associações que lutam há anos para obter alojamento em grandes cidades para refugiados de outros países em guerra vão certamente gostar de ouvir isso.

Não podemos esquecer que essas portas foram fechadas a africanos, sírios e os requerentes de asilo afegãos que – enquanto aguardavam uma solução definitiva – tiveram de se deslocar de hotéis para hostels sem qualquer possibilidade de integração séria.

Certamente que a situação destes refugiados ucranianos é terrivelmente dramática. E é normal que sejamos naturalmente mais sensíveis ao destino dos nossos concidadãos europeus. Também é um caso clássico que países vizinhos acabam sempre por acolher mais. Há uma espécie de responsabilidade de proximidade.

O que o Líbano fez pelos sírios, a Polónia está prestes a fazer pelos ucranianos, mas devemos ter em mente alguns princípios. Os ucranianos podem vir para a Europa sem visto, por isso não estamos a tratar de pedidos de asilo geridos pelo Processo de Dublin.

Por último, mas não menos importante, os ucranianos não vêm para os nossos países para ficarem. A maioria deles quer ficar perto da sua terra natal e voltar assim que puder.

No entanto, há algo de positivo no que está a acontecer. Está a ajudar-nos a mudar um pouco da nossa relutância europeia em relação às pessoas deslocadas.

Assim, os polacos e húngaros, que deixaram a Grécia e a Itália por conta própria para lidar com o fluxo de migrantes do Mediterrâneo, estão a perceber que há benefícios na solidariedade europeia em termos de acolhimento de estrangeiros.

A Hungria, que se tinha fechado, já flexibilizou as suas condições para permitir aos refugiados um acesso rápido ao emprego.

Os europeus estão, assim, a tomar consciência de que o seu continente não está imune às tragédias da história, e que aquilo a que assistimos no Médio Oriente nos últimos 20 anos pode acontecer no nosso continente, com a sua quota-parte de tragédias humanas e deslocamentos.

Começaremos agora a olhar de forma diferente para o estrangeiro que vem bater às nossas fronteiras?

Desde que este olhar se mantenha guiado por uma solidariedade à escala da humanidade e não se limite a uma identidade dita europeia.

O facto de que Africanos que estudavam na Ucrânia terem tido dificuldade em atravessar para a Polónia é preocupante.

A visão europeia da pessoa humana deve permanecer universal.

 

Artigo de Isabelle de Gaulmyn, publicado no La Croix International a 5 de Março de 2022.