Arquidiocese de Braga -

10 novembro 2021

A pastoral da escuta

Fotografia Avvenire

DACS com Avvenire

Projecto "Jovens e Bispos" coloca intervenientes em diálogo franco, aberto e próximo.

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Está destinada a ficar na memória a cena, na manhã de sábado na Catedral de Milão, dos bispos das dioceses lombardas empenhados em tomar notas enquanto uma dezena de jovens sentados à volta de cada um um falavam com maestria e desenvoltura de grandes temas pessoais e planetários, da ecologia do afecto.

Uma perspectiva invertida da usual, para iniciar um diálogo directo que será o eixo do projecto “Jovens e Bispos” lançado pelas Igrejas da Lombardia com uma abertura sensacionalmente bela, tão nova, verdadeira, promissora. Existe, porventura, um modo mais adequado para definir o cenário de uma catedral majestosa, preenchida por grandes mesas – nos corredores laterais, no transepto, na abside, onde quer que houvesse um espaço livre – que permitam encontrar as reflexões, sem obstáculos, dos jovens e a escuta atenta dos seus pastores?

O diálogo entre eles não é certamente uma novidade, as Jornadas da Juventude vivem do encontro entre a Igreja e as novas gerações. No mínimo, a suposição do diálogo entre pares como um método destinado a cultivar o terreno para o encontro e a missão é disruptiva. A questão da juventude está emaranhada, e o desaparecimento de muitos adolescentes e jovens do caminho educativo da Igreja levanta questões que precisam de ser abordadas. Ninguém diz que é fácil: escalar a montanha de um tempo incerto e de uma cultura que semeia imposturas será muito mais um caminho estreito do que uma cómoda autoestrada. Mas a Igreja italiana sabe, hoje mais do que nunca, que seguindo a direcção do diálogo e da escuta há uma passagem. Apertada, mas aí está ela. Trata-se de protegê-la, sem deixar que a vegetação das coisas habituais e um certo cepticismo generalizado a façam desaparecer.

Se todos se envolverem, pode acontecer como hoje em Milão: no final todos estão muito mais do que felizes, motivados a sentir-se novamente no início de uma jornada na melhor das companhias, como os discípulos no Mar da Galileia, e não dentro de um beco que é suspeito de ser um beco sem saída. É claro que para os jovens – ainda mais para os jovens católicos – é importante saber que são levados a sério por uma Igreja que prefere o compromisso de os acompanhar fielmente onde quer que estejam a oferecer o pacote completo para as suas vidas. Numa época de terrível solidão, isto faz uma grande diferença. Quem no seu coração aspira à autenticidade de pertença cristã em todos os ambientes, mas duvida que o consiga, pede hoje para se sentir amparado por uma presença fraterna que não falha diante de nada, com a qual pode contar mesmo quando a navegação leva a águas tempestuosas. Quem não julga, mas escuta, dirige sem oprimir, porque compreende perfeitamente que a nossa humanidade nunca está inteira. E então acontece que os jovens e os seus pais na fé podem encontrar-se como entre pessoas que se julgavam distantes e, em vez disso, se encontraram numa casa que foi profundamente sentida como a sua. O melhor lugar para passar a vida e convidar outras pessoas a entrar.

A prova disto é o clima de profunda alegria que se respirou no adro da Sé Catedral no fim de quase três horas de debate em catorze mesas, com o mesmo número de bispos ao lado de duzentos jovens entre os 18 e os 30 anos, com as mais díspares experiências pessoais, estudantis, profissionais e eclesiais. Tudo tão belo a ponto de fazer uns e outros dizerem “aqui, é assim que fazemos”. Serviu para compreender que o estilo do caminho “sinodal” também entre os nossos jovens deve ser a partilha sincera de perguntas, experiências, angústias, fragilidades e impulsos, sentindo-se parte – os jovens e a Igreja – ao mesmo tempo e abatendo o muro invisível que separa quem procura as respostas e quem as oferece. A definir onde e em quem encontrar a palavra de verdade que se deseja será, então, uma autoridade reconquistada com absoluta credibilidade. Porque agora não se trata de decidir que actividades realizar para recuperar os jovens que foram para outras paróquias e oratórios ou que não parecem interessados ​​em nada que esteja relacionado com a religião, mas de sentir que todos somos companheiros de vida, complicada como é, e que as perguntas feitas pelos jovens aos seus pastores pertencem a ambos. A todos.

É a questão educacional relida numa sociedade pós-pandémica que corre o risco de ser devorada pela pressa de voltar para o tempo “antes” sem ver que muita coisa mudou no coração das pessoas, e em primeiro, nos jovens. Está a passar a oportunidade de se mudar de perspectiva, também na pastoral. Os jovens estão a dizer-nos que, se os escutarmos com atenção, como ontem os bispos lombardos, haverá muito que entender sobre o novo à nossa volta e dentro de nós.

 

Artigo de Francesco Ognibene, publicado em Avvenire a 6 de Novembro de 2021.