Arquidiocese de Braga -
23 julho 2016
Décimo Sétimo Domingo (Ano c)
Carlos Nuno Salgado Vaz
Orar não é pedir favores. É sobretudo escutar, louvar, adorar, agradecer, admirar, pedir perdão, contemplar.
Se, há 15 dias, víamos que o discípulo de Cristo é aquele que procede como o bom samaritano, aproximando-se com ternura, tempo e total disponibilidade para ajudar o irmão necessitado, nem que seja um tido como inimigo; se, na semana passada, fomos convidados a escolher como Maria a boa parte, a de quem, em primeiro lugar, escuta calmamente o Senhor, se deixa instruir por ele e só então se lança ao trabalho com toda a sua entrega; neste domingo, somos convidados a ser homens e mulheres de oração.
Pai nosso
Jesus, na versão do evangelista Lucas, rezava muito e sobretudo nas situações de maior empenhamento: escolha dos discípulos, manifestação no Tabor, entrega na cruz.
E com a oração do Pai Nosso oferece-nos, como dizia Tertuliano, uma autêntica súmula do Evangelho. No Pai Nosso, está concentrado tudo o que de realmente importante nos dizem os evangelhos e de que nós devemos saber fazer oração.
Desde logo, o tipo de relação com Deus: a da total confiança de um bebé nos seus pais, a quem chama de «papá» e «mamã».
O «Abba», que há que soletrar, tal qual como acontece com uma criança dirigindo-se amorosamente aos seus pais, está a indicar-nos que a nossa relação com Deus tem de ser uma relação de profunda intimidade e total confiança.
Na versão de Lucas, as petições do Pai Nosso são 5:
Santificado o teu Nome,
Venha o teu reino,
Dá-nos o pão nosso de cada dia,
Perdoa os nossos pecados,
Não nos deixes cair na tentação.
Dá-nos o pão nosso de cada dia
A terceira petição – Dá-nos o pão nosso de cada dia – é, de acordo com a retórica bíblica, o pedido mais importante, por ser o pedido que está no meio. É como que a clave musical de toda a oração e relação com Deus Pai, afirma Dom António Couto.
Pedir «o pão nosso» é dizer que o «pão nosso» não é o «pão meu». Ou seja, o pão que está sobre a minha mesa, dado por Deus, não é «meu». É «nosso». Por isso já não é possível comer descansado, quando sei que há irmãos meus que passam fome. É esta a indissociável dimensão social, horizontal, da oração.
O «Pão nosso» é um desafio e um convite muito forte ao exercício constante, afetivo e efetivo da fraternidade.
Santificado seja o teu nome
Quando pede: «Santificado seja o teu nome», o discípulo declara ao Pai a sua própria disponibilidade para se deixar envolver, colaborar com ele para que esta promessa de bem se realize.
O orante pede que todos O possam reconhecer como o Deus três vezes santo. Não conhece «nem o dia nem a hora», (Marcos 13, 32) mas tem a certeza de que a sua oração será atendida. Como o foi a oração de Abraão.
Venha a nós o vosso Reino
A segunda petição – «venha a nós o vosso Reino» – leva-nos a pensar que o Reino de Deus, que aparece 122 vezes no Novo Testamento, sendo noventa pela boca de Jesus, ainda está no início.
O Reino de Deus, como semente de bem, de amor, de reconciliação e de paz deve desenvolver-se e crescer em cada pessoa.
A oração faz com que se evitem equívocos. Ajuda a discernir entre os reinos sedutores e atraentes deste mundo – mas enganadores – e o verdadeiro Reino de Deus.
Perdoai-nos as nossas ofensas
O perdão dos pecados está condicionado pelo perdão dado aos irmãos.
Não nos deixeis cair em tentação
O último pedido, que não nos deixe cair em tentação, não é para não termos tentações, mas para não cedermos às seduções deste mundo, para não sermos tocados pela ideia de abandonar o Mestre.
A oração não muda Deus...
A parábola do homem que vai pedir pães ao amigo durante a noite serve sobretudo para nos dizer que a oração só obtém resultados se for prolongada. E isto, não porque Deus queira ser interpelado longamente antes de nos conceder alguma coisa, mas porque o homem precisa de muito tempo para assimilar os seus pensamentos e os seus sentimentos.
As nossas orações, muitas vezes, parecem tentativas para convencer Deus a mudar o seu projeto sobre nós. Gostaríamos que ele se adaptasse às nossas ideias. Mas se falarmos demoradamente com Ele e com todo o amor filial, acabaremos por entender o seu amor e por aceitar os seus desígnios.
A oração não muda Deus; abre a nossa mente, modifica o nosso coração. E se o olhar com que contemplamos a nossa situação, o mundo e os irmãos, é diferente, mais puro, mais divino, a oração terá obtido o seu resultado.
Orar não é pedir favores. É sobretudo escutar, louvar, adorar, agradecer, admirar, pedir perdão, contemplar.
O dom supremo que Deus nos pode conceder é a força para realizar a sua vontade na nossa vida. É muito mais importante que Ele nos conceda a graça de fazer a sua vontade do que Ele fazer a nossa vontade.
Santo Agostinho recomendava: «esforça-te como se tudo dependesse de ti; confia em Deus como se tudo dependesse dele». Deus ajuda quem trabalha, quem põe tudo quanto depende de si nas labutas do dia a dia.
Espírito Santo
A graça maior que a oração nos pode alcançar é o Espírito Santo, porque só Ele nos pode fazer escutar Deus e sugerir-nos palavras que nos ponham em diálogo com Ele, porque assim nos consente que assumamos o seu querer.
O Espírito derrama nos nossos corações a capacidade de nos reconhecermos filhos de Deus e irmãos de Jesus; de reconhecer todos e tudo como queridos, criados e amados por Deus. E assim a oração nos transforma, levando-nos a viver a relação com o Pai, através do seu Filho Jesus Cristo, no poder do Espírito Santo.
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