Arquidiocese de Braga -
25 junho 2016
Décimo Terceiro Domingo (Ano C)
Carlos Nuno Salgado Vaz
Jesus propõe-nos uma entrega de totalidade. E para sempre, como sucede com os grandes e verdadeiros amores. Não quer corações partidos, mas inteiros e a tempo inteiro, com entusiasmo e sã alegria.
A passagem do evangelho do Décimo Terceiro Domingo (Ano C) constitui o início da parte central do Evangelho de Lucas (9, 51 – 19, 28), nada menos que dez capítulos. Nesta parte central do evangelho é-nos narrada a viagem de Cristo desde a Galileia até Jerusalém, onde terminará a sua missão.
A importância dada por Lucas a esta parte ressalta ainda do facto que Marcos lhe dedica apenas um capítulo, e Mateus, dois. Isto mostra-nos também que não estamos tanto diante de uma viagem geográfica, mas de uma viagem que podemos apelidar de teológica, com uma tripla dimensão: pastoral, missionária e catequética.
A narrativa começa com uma grande solenidade. Se a tradução litúrgica: «Aproximando-se os dias de Jesus ser levado deste mundo», parece apontar para a Ascensão, facto ainda mais evidente na versão espanhola: «quando se ia cumprindo o tempo de ser levado ao céu», o texto original diz: «quando se cumpriam os dias da sua partida deste mundo», isto é, os dias da sua morte, ressurreição e ascensão, Jesus tomou a firme resolução de se encaminhar para Jerusalém.
Soberana liberdade
Jesus enfrenta este momento crucial da sua vida com uma soberana liberdade. A liberdade de quem assume com inteireza a sua missão sabendo quão grande é o tesouro que se descobre.
É nesta base que o texto do evangelho nos quer dizer que a abundância e a alegria do banquete do Reino que nos é oferecido exige um preço para podermos gozar de tal tesouro.
Dizia a propósito o grande filósofo Kierkegaard: «Que cada um veja claramente o que significa ser cristão e eleja com retidão e sinceridade se o quer ser ou se renuncia a ele. E que se advirta solenemente o povo sobre isto: Deus prefere que confessemos honestamente que não somos nem queremos ser cristãos. É talvez esta a condição que nos permite chegar a sê-lo. Deus prefere esta confissão mais que a náusea de um culto que se mofa e ri dele».
Quer isto então dizer que, para ser cristão temos que ser pessoas impecáveis e que qualquer tropeço é uma apostasia da fé? De maneira alguma.
Diz de maneira bela Michel Quoist: «Não importa cair no caminho; o que importa é cair subindo» O que importa é que tenhamos sempre muito clara onde está a meta para onde nos dirigimos. Péssimo seria que tentássemos adoçar e baixar as exigências do seguimento evangélico de Jesus.
Com razão afirma J. B. Metz que o grande desafio dos cristãos na Europa é decidirmo-nos entre uma religião burguesa, ou um cristianismo de seguimento autêntico e verdadeiro de Cristo. Temos de viver à maneira de Jesus e não como vão soprando os ventos.
Um cristianismo que ficasse reduzido a alguns momentos e uns poucos ritos religiosos de pouco valeria. Que influência poderá ter nas pessoas uma religião que não exige mais que três quartos de hora aos domingos?
Exigências do seguimento
As exigências do seguimento de Jesus soam com muita dureza aos nossos ouvidos. E se forem mal entendidas podem levar a criar uma ideia de um Jesus sem coração.
Tais expressões exigem ser entendidas em sentido metafórico. São expressões de tipo oriental, intencionalmente exageradas para pôr em maior relevo a mensagem que se quer transmitir. E o essencial é compreender que seguir Jesus exige radicalidade na nossa entrega.
Sabemos bem como Jesus defende o amor e o cuidado dos pais anciãos. O que queria dizer-nos ao afirmar «deixa que os mortos sepultem os seus mortos» é que ninguém pode deixar-se enredar por uma família possessiva. Cada membro deve fazer uma opção livre. A família não pode condicionar o chamamento a segui-LO e a trabalhar pelo Reino.
As exigências colocadas aos três que Jesus chama são feitas a cada um de nós:
1) Revestir-se de paciência e misericórdia, e libertar-se de todo o fanatismo, bem representado nos denominados «filhos do trovão», Tiago e João que queriam destruir com fogo a cidade que não os recebeu;
2) Para seguir a Jesus pobre – o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça –, temos que eleger a pobreza como caminho de liberdade e felicidade. É essa a primeira bem-aventurança;
3) O seguimento exige uma decisão radical – não olhar para trás. Não se pode ser cristão no templo e pagão na vida quotidiana. Ou como afirmava alguém com propriedade: 'Cristo necessita cristãos de todos os dias da semana e não apenas de 50 minutos ao domingo.
Jesus propõe-nos uma entrega de totalidade: «amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças. E para sempre, como sucede com os grandes e verdadeiros amores. Não quer corações partidos, mas inteiros e a tempo inteiro, com entusiasmo e sã alegria.
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