Arquidiocese de Braga -
18 março 2021
A graça dos tempos que vivemos
Nota pastoral com orientações pastorais após a reabertura das igrejas.
\n \nCom a reabertura das igrejas e a possibilidade de voltarmos a celebrar a Eucaristia com o povo, teremos de ir pensando, sinodalmente, como transformar as situações adversas que temos em graças. Tudo nos deverá conduzir à centralidade do Mistério Pascal. Ainda teremos alguns dias para o preparar convenientemente. Sabemos que a Páscoa se vive até ao dia do Pentecostes. Talvez tenha sido menor o tempo de preparação, mas devemos alargar os dias para uma vivência, pessoal e comunitária, de encontro com Cristo Vivo e Ressuscitado. Não podemos, por isso, desperdiçar estes últimos dias da Quaresma e da Semana Santa para um tempo pascal ainda mais festivo.
O período da Páscoa não será celebrado com os habituais sinais festivos dos compassos pascais que caminham pelas ruas e entram nas casas. Desprovidos de sinais, devemos promover encontros de interioridade com Cristo vivo para que Ele, o Bom Samaritano, percorra os caminhos da vida com os seus problemas e dificuldades, oferecendo, por intermédio de todos os cristãos, uma presença libertadora. Importa, como sempre, que Cristo ressuscite e que manifestemos o quanto é capaz de realizar por nosso intermédio. É oportuno reflectir e rezar em comum para redescobrir o verdadeiro sentido da Quaresma e da Páscoa, sabendo que a conversão pastoral será verdadeira se partir da conversão pessoal.
Todos nós gostaríamos de orientações muito concretas e a aplicar uniformemente em todas as comunidades. Sabemos que não é possível. Teremos de viver uma criatividade responsável. Não poderemos fazer o que gostaríamos. Tudo está condicionado ao bem de todos. Nada poderá ser realizado se oferecer a mínima possibilidade de contágio. Teremos de estar permanentemente atentos às orientações da Direção Geral de Saúde para discernir convenientemente, não deixando de realizar tudo o que é possível e evitando o que possa facilitar o desenvolvimento da pandemia. As determinações são conhecidas mas devem continuar a ser escrupulosamente observadas sem aventureirismos ou interpretações subjetivas. Por outro lado, não deixemos de gastar quanto é necessário para dar tranquilidade e garantir segurança.
1. Elaboremos, por isso, em comunidade, um programa que integre mais encontro com a Palavra. Poderá acontecer nos poucos dias que restam até à Páscoa mas, alargando até ao Pentecostes, apostemos numa caminhada com itinerários e propostas a realizar de modo presencial, quando possível, mas também servindo-nos das oportunidades que o digital nos proporciona.
2. Abrimos as nossas igrejas com a alegria de nos reencontrarmos comunitariamente. Convido a que alarguemos o horário de abertura convidando os cristãos para períodos de oração pessoal. Mais do que nunca, necessitamos de cultivar uma espiritualidade séria que alimente o encontro com Cristo. Louvo a iniciativa das paróquias e capelanias da cidade de Braga que, não podendo realizar o lausperene nos horários habituais antes da Páscoa, decidiram fazer com que ele se prolongue até ao Pentecostes.
Necessitamos de intensificar e aperfeiçoar o modo de fazer oração. Teremos de o fazer em família e em comunidade. Também a oração individual é garante da qualidade da vida cristã. Entrar numa igreja para fazer uma visita ao Santíssimo, para uma leitura orante da Palavra deve tornar-se um hábito na vida dos cristãos. Poderá, também, ser chegada a hora para constituir pequenos grupos de oração, talvez a partir da dinâmica dos Grupos Semeadores de Esperança.
3. A Doutrina da Igreja sublinha a importância do sacramento da reconciliação, a celebrar individualmente sempre que necessário, mas particularmente no tempo que antecede a Páscoa, assim como durante o Tempo Pascal. Organizem-se, por isso, horários que permitam a celebração individual de um modo sereno e tranquilo. Preparemos celebrações penitenciais que ajudem cada um a encontrar-se consigo próprio; neste tempo, que consideramos de necessidade grave, de harmonia com a Nota Pastoral sobre o Sacramento da Reconciliação, solicitando autorização para cada caso, permite-se a celebração do sacramento da reconciliação com absolvição colectiva, e sempre com o propósito de realizar a reconciliação individual logo que seja possível.
Não será de aproveitar esta circunstância para reorganizar um serviço de confissões, estável e permanente na sede dos concelhos ou lugares centrais, com sacerdotes disponíveis para acolher e mostrar o amor de Deus a exigir compromissos de fidelidade e atenção aos outros?
4. Deixo algumas orientações concretas:
4.1. Reabrimos as nossas igrejas e recomeçaremos com as celebrações eucarísticas. Podem ser em qualquer dia e hora, Sábados ou Domingos. Também todos os sacramentos podem ser celebrados. Os sacerdotes podem deslocar-se para diferentes concelhos, por motivos pastorais, devendo ser portadores do cartão de identidade sacerdotal para comprovarem que estão no exercício do ministério.
4.2. Nas celebrações, e em qualquer actividade pastoral, saberemos respeitar o distanciamento e cumpriremos todas as orientações quanto a higienização dos espaços e lavagem das mãos.
4.3. Quanto à catequese, reafirmamos quanto foi comunicado no Dia Arquidiocesano do Catequista.
4.4. Nos funerais ninguém deve ser privado de eucaristia e de acompanhamento aos cemitérios. Também os velórios são momento de sufrágio e de proximidade com os familiares.
4.5. Podemos ir marcando a celebração de crismas, desde que seja para pequenos grupos, sempre dentro das capacidades dos espaços. Poderão ser inter-paroquiais se as circunstâncias o permitirem.
4.6. No Domingo de Ramos celebraremos a comemoração da entrada de Jesus em Jerusalém segundo a segunda forma prevista pelo Missal Romano. Evitem-se ajuntamentos e os ministros e os fiéis tenham nas mãos os ramos de oliveira, não permitindo a entrega ou troca de ramos.
4.7. Na missa vespertina da “ceia do Senhor” omita-se o lava-pés.
4.8. O acto de Adoração da Cruz, na Sexta-feira Santa, o beijo da cruz, seja limitado só ao Presidente da Celebração. Há diversas modalidades de adoração da Cruz sem necessidade de beijar.
4.9. Não é permitida a realização do Compasso ou Visita Pascal, assim como qualquer “saída simbólica da cruz”.
4.10. Precisamos de ir prevendo o Verão com casamentos e baptizados. Sejamos realistas e esperemos pela real evolução da pandemia. Todos os casos devem ser ponderados com um grande sentido de responsabilidade. Não se trata de fazer ou não fazer. Não paremos. A vida das comunidades continua. Talvez com menos concentrações e sinais exteriores mas com mais profundidade no essencial de um encontro pessoal e comunitário com o Cristo.
As festas, com toda a probabilidade, não poderão ter grandes manifestações exteriores, nomeadamente procissões. Não as cancelemos. Há modos de as fazer. É chegada a hora de voltar aos Tríduos ou Novenas, estruturados de uma maneira diferente e adaptada à diversidade de grupos da paróquia. Precisamos de regressar ao essencial e podem ser feitas experiências maravilhosas.
4.11. Não sabemos o que vai acontecer com as peregrinações. Se os cristãos não tiverem oportunidade de aceder em multidão aos santuários, é possível encontrar modos para que Nossa Senhora se encontre com as famílias. Realizar um encontro com todas as Confrarias com peregrinações enriquecerá quanto poderá ser realizado em cada Santuário, mas não deixemos de as fazer e preparar convenientemente.
4.12. Queremos que a vida das comunidades continue. As Visitas Pastorais acontecem como estímulo de renovação. Serão programadas dentro do calendário tradicional e serão realizadas com todos os cuidados.
4.13. É de esperar que a celebração do mês de Maio possa acontecer em todas as igrejas e capelas. Em simultâneo, deve haver uma proposta para que as famílias, neste ano dedicado à Amoris laetitia, sejam ajudadas e estimuladas a momentos de devoção mariana. Para sublinhar que caminhamos juntos em atitudes samaritanas, Maria pode ser lembrada como aquela que se levantou e foi apressadamente ao encontro de sua prima Isabel para a servir.
5. Aos sacerdotes convido para o encontro habitual da Quinta-feira Santa. Será, excepcionalmente, na Cripta do Santuário do Sameiro. Os sacerdotes devem estacionar em frente da cripta e entrar já paramentados para evitar contactos.
Renovando as nossas promessas sacerdotais, revigoramos o dom da vocação e damos alegria ao exercício do nosso ministério num tempo que não poderá desmotivar-nos. Não faltemos. Também alguns fiéis podem participar, de harmonia com a capacidade do espaço.
6. O tempo da Quaresma e Páscoa é sempre tempo para uma consciencialização de pertença à Igreja. Importa incrementar este sentido alertando para a alegria de contribuir para a vida da comunidade com todas as suas exigências e alargando a partilha para permitir que o Contributo Penitencial seja expressão de uma Igreja aberta às necessidades do mundo.
Recordamos, também, o dever de contribuirmos para os Lugares Santos e São Pedro nas celebrações da Sexta-feira Santa.
7. Este Tempo Pascal significa o centro do Ano Pastoral. Não pode ser vivido sem dar consistência ao Programa Pastoral. Importa, por isso, encontrar modos para cultivar a caridade que dê expressão a uma Igreja Sinodal e Samaritana. Não queremos ser comunidades autorreferenciais. Agimos e vivemos para cuidar de todos mas discernimos propostas que tornem as famílias “igrejas domésticas”, vivendo o ano da Amoris Laetitia que o Santo Padre propôs. Nas circunstâncias de isolamento social, teremos de redescobrir a beleza da Igreja Doméstica. O essencial da vida cristã é a relação pessoal e comunitária com Jesus Cristo vivo e presente em cada um dos seus discípulos, na família e nas comunidades. Ele prometeu estar no meio de dois ou três discípulos que se reúnem no seu amor vivendo entre eles o mandamento novo. “A presença do Senhor habita na família real e concreta, com todos os seus sofrimentos, lutas, alegrias e propósitos diários... a espiritualidade matrimonial é uma espiritualidade do vínculo habitado pelo amor divino.” (A.L. 315)
Aos jovens teremos de dedicar uma predilecção especial. Estamos a caminho das Jornadas Mundiais da Juventude. Sabemos que devemos caminhar com eles, ouvindo-os e tornando-os protagonistas, para que se encontrem com Cristo de modo a descobrirem a Igreja, como consequência, e a trabalharem no mundo, como construtores de uma sociedade alicerçado em valores.
A pandemia veio agravar a situação económica e social. Ainda não descortinamos todas as consequências. Há que procurar ajudar pessoas e famílias a encontrar ou reencontrar um projecto de vida fecundo, fiável e feliz. Teremos de atender a necessidades imediatas (alimentos, rendas, medicamentos...) ou mais profundas (sentido da vida no luto, no desemprego, na depressão...). Os novos rostos da pobreza atestam necessidades espirituais, físicas, relacionais que se encontram num vazio interior e na falta de sentido da vida. Os idosos, as pessoas com deficiência mental, os fenómenos de isolamento não podem ser negligenciados.
Na impossibilidade de realizar muitas actividades, precisamos de demonstrar verdadeira paixão pelas famílias, jovens e acção social. Muita vida poderá acontecer.
8. Com muita ousadia e serenidade, vamos recuperar o sentido evangelizador neste tempo Pascal que se aproxima. Que Cristo Vivo e Ressuscitado nos entusiasme e dê forças para vencer todas as contrariedades que nos vão sendo colocadas no caminho.
Permaneçamos unidos no cumprimento das determinações e trabalhemos para que a Páscoa seja um acontecimento transbordante de graças em ordem à renovação da Arquidiocese que queremos que apresente um rosto Sinodal e Samaritano. Aos sacerdotes renovo a minha solicitude e amizade pessoal e recordo-lhes que caminhando juntos encontraremos o cêntuplo que Cristo prometeu. Não nos deixemos desanimar. Na fé estamos a descortinar um tempo novo que está a nascer. É inútil mal dizer o vírus. Com ele muita coisa nova pode acontecer, mesmo que não nos estejamos a aperceber.
Que Santa Maria de Braga, São Martinho de Dume e São Bartolomeu dos Mártires nos concedam o dom de caminharmos com uma grande coragem criativa, à imagem de São José, tornando este tempo rico de experiências que mostrem a Igreja Sinodal e Samaritana que somos e a que queremos dar maior visibilidade.
† Jorge Ortiga,
Arcebispo Primaz
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