Arquidiocese de Braga -

24 abril 2004

Com Alexandrina em Santa Maria Maior

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Fotografia

D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga

\n(Homilia da Vigília de Oração na Baílica de Santa Maria Maior, em Roma) A Vida de Alexandrina está marcada por devoções que testemunham a grandiosidade da sua alma. Ninguém desconhece a centralidade que dava a Jesus e a Jesus Eucaristia. Só que Nossa Senhora, a quem com muito carinho chamava de «querida mãezinha», acompanhava este mesmo amor. Todos os dias rezava: «Ó mãezinha, abri-me os vossos santíssimos braços, tomai-me sobre eles, estreitai-me ao vosso santíssimo Coração, cobri-me com o Vosso manto e aceitai-me como vossa filha muito amada, muito querida, e consagrai-me toda a Jesus. Fechai-me para sempre no seu Divino Coração e dizei-lhe que O ajudais a crucificar-me, para que não fique por crucificar… Ó mãezinha, fazei-me humilde, obediente, pura, casta na alma e no corpo. Fazei- -me um anjo; transformai-me toda em amor, consumai-me toda nas chamas do amor de Jesus». Nesta Basílica de Santa Maria Maior, a primeira a ser dedicada a Nossa Senhora na cidade de Roma, queremos preparar-nos para a Beatificação colocando-nos na atitude e amor de Alexandrina a Nossa Senhora. Merece particular relevo a Consagração a Nossa Senhora e o trabalho efectuado para que o Papa Pio XII efectuasse a consagração do mundo ao Coração Imaculado de Maria, em 31 de Outubro de 1942. «Consagrar-me toda a Jesus». Perdeu-se ou vai-se perdendo esta consciência da consagração que se pensa reservada a alguns cristãos. O Santo Padre na Exortação Pastoral Sinodal Vita consacrata referia que os religiosos e os sacerdotes eram caracterizados por «uma nova e especial consagração» (V. C. 30), por «uma distinta vocação e uma específica forma de consagração, em vista duma missão peculiar» (V. C. 31). Urge redescobrir o verdadeiro significado da palavra consagração. Sabemos que no uso profano ela significa o acto ou a condição daquele que se dedica com totalidade e exclusividade a qualquer empenho de tal modo que fica absorvido por ele, por exemplo, alguém que se consagra à investigação científica. Por outro lado, também se usa, para reconhecer que alguém é investido numa dignidade ou função, um rei, um artista, etc. No sentido religioso encerra um significado dum acto de oferta de lugares, coisas ou pessoas à divindade. Como tal supõe uma «separação» dos usos profanos e um «destino» para o culto. «Separação» como aspecto negativo e «dedicação» como aspecto positivo. O culto pagão sublinhava mais o negativo; a Bíblia mostra mais o positivo. Consagrado é, assim, aquele que «pertence» a Deus e «participa» de Deus e do qual Deus se serve para o tornar presente e operar na história. Neste sentido, consagrar-se, é mergulhar numa comunhão de vida, acolher uma participação plena do modo de pensar, de amar e de agir de Cristo e suscitar uma assimilação vital dos valores do Reino que se vivem e se comuniquem. Esta consagração assume-se no Baptismo e vive-se na vida. «Cristo Senhor, Pontífice tomado de entre os homens (cf. Heb. 5, 1-5), fez do novo povo «um reino de sacerdotes para Deus e Seu Pai» (cf. Apoc. 1, 6, 5, 9-10). Pela regeneração e pela união do Espírito Santo os baptizados são consagrados para serem edifício espiritual e sacerdócio santo, de modo que ofereçam, em toda a sua actuação cristã, sacrifícios espirituais e proclamem as grandezas d’Aquele que os chamou das trevas para a Sua luz maravilhosa (cf. 1 Ped. 2, 4-10). Perseverando no louvor de Deus (cf. Act. 2, 42-47), ofereçam-se todos os discípulos de Cristo como hóstia viva, santa, agradável a Deus (cf. Rom. 12, 1), rendam testemunho de Cristo em toda a parte, sempre prontos a dar uma razão a quem os interrogar acerca da esperança, que neles existe, da vida eterna (cf. 1 Ped. 3, 15). L.G. 10. O Baptismo insere-nos em Cristo e torna-se a base e o fundamento de tudo, mas ele não é tudo na vida cristã. Com ele começa-se a ser cristão e somos colocados em condições para poder receber vocações, missões, encargos particulares com as qualidades e os talentos capazes para as concretizar. Uma consagração inicial e diversas formas de consagração e algumas consagrações «especiais» associadas ao Sacramento da Ordem e Profissão e Vivências dos Conselhos Evangélicos: eis a síntese da vocação cristã. A Beata Alexandrina poderá ajudar-nos a compreender esta doutrina. Pelo Baptismo somos «consagrados» a Jesus em «toda» a nossa vida e, por isso, no quotidiano identificamo-nos com Ele nas virtudes através duma vida coerente com o Evangelho, e «consumindo», ou seja, gastando-a no amor -- entrega da nossa vocação pessoal e num interesse pelas vocações de especial consagração. Alexandrina dizia: «Consagrai-me toda». «Transformai- -me toda em amor» «Consumi-me toda»». As leituras de hoje recordavam o verdadeiro estatuto do cristão como aquele que «obedece antes a Deus que aos homens» e que se torna testemunha das maravilhas sem receio a intimidações e ficando cheios de alegria por terem merecido ser ultrajados por causa de Jesus. A nossa Igreja necessita desta consciência de consagração e dum apreço maior pelas vocações de especial consagração. Iniciamos a Semana de Oração pelas Vocações de especial consagração. Lamentamo-nos da diminuição dos Sacerdotes e das Religiosas. Vivendo a vida como consagrados muitas vocações surgirão. Alexandrina no leito da dor orientou muitos jovens e adolescentes para a vida sacerdotal e religiosa. Esta Vigília reveste-se do significado de preparação para viver o dia de amanhã. Ao mesmo tempo, quer colocar a Arquidiocese de Braga e a Igreja em Portugal nesta maneira conciliar de acolher o Baptismo. Não é uma formalidade ou um costume. É uma vocação onde Deus chama para um projecto pessoal e único. Toca a cada um percorrê-lo com sinceridade e verdade. O caminho pode não ser fácil. A alegria de ser fiel ao amor será a nossa consolação. Terá sido inútil a vida de Alexandrina? Quantas pessoas mais importantes do que ela já passaram ao esquecimento? Neste local mariano gostaria de interpelar-vos a pedir a Deus, por Maria, as seguintes graças: 1 – Que os nossos cristãos ultrapassem um cristianismo sociológico ou por tradição e consigam chegar a esta consciência de ser pertença de Deus que tomou essa iniciativa. 2 – Que as nossas comunidades sejam constituídas por pessoas com consciência vocacional, ou seja, atentas a um Deus que ama em primeiro lugar e chama a corresponder. 3 – Que as vocações de especial consagração – sacerdotes, religiosos e religiosas -- caminhem numa fidelidade alegre aos seus compromissos e sejam amadas e acompanhadas pelo amor que Alexandrina lhes dedicou na sua vida terrena. 4 – Iniciamos a Semana de Oração pelas Vocações de especial consagração. Deixo um excerto da mensagem do Santo Padre: «A oração ligada ao sacrifício e ao sofrimento reveste um valor particular. O sofrimento, vivido como cumprimento daquilo que falta à sua própria carne, «aos sofrimentos de Cristo a favor do seu Corpo, que é a Igreja» (Col, 1,24), torna-se uma forma de intercessão mais eficaz do que nunca. Muitos doentes, em todas as partes do mundo, unem os seus sofrimentos à cruz de Jesus, para implorar vocações santas! Eles acompanham-me espiritualmente, no ministério petrino que Deus me confiou e oferecem à causa do Evangelho uma contribuição inestimável, embora muitas vezes de modo oculto». Não foi isto a vida de Alexandrina? Santa Maria Maior, 24-04-04 +Jorge Ortiga, A. P.