Arquidiocese de Braga -

25 dezembro 2008

O desemprego em muitas famílias

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D. Jorge Ortiga

Natal 2008 " Sé Catedral

Homilia de Natal proferia na Sé Catedral

\nDas leituras acabadas de proclamar duas ideias força nos são comunicadas.
Em primeiro lugar, Deus que fala pelo Seu Filho que nasce como Salvador. “ Muitas vezes e de muitos modos falou Deus antigamente aos nossos pais pelos profetas. Nestes dias falou-nos por Seu Filho.” “Eu serei para Ele um Pai e Ele será para Mim um Filho.” (Heb 1, 1-5). “No princípio era o Verbo… O Verbo era Deus… O Verbo fez-se carne e habitou entre nós”. (Jo 1, 1-18).
Por outro lado, a alegria de ser anunciador desta Palavra que é Cristo que a trouxe a este mundo. “Como são belos sobe os montes os pés do mensageiro que anuncia a paz que traz a boa nova, que proclama a salvação” (Is 52, 7). Muitos têm oportunidade de ver com os próprios olhos que Cristo Salvador consola o seu povo e resgata Jerusalém. É a luz que brilha e que alguns acolhem e outros não a querem conhecer.
Destas duas ideias ouso questionar as nossas vidas. O Natal é Deus que se manifesta tornando-se homem e daí que, acolhendo-O na Sua Palavra, teremos de o propor com ousadia e serenidade. No nascimento de Cristo, o invisível torna-se visível; agora, a Igreja, através dos cristãos, tem a missão de nas coisas visíveis deste mundo tornar visível o invisível, que é Deus. Sabemos que sempre Deus se manifestou na história, ou seja, nos acontecimentos da existência humana. Aqui e agora, continua a sua missão não sublinhando o escuro dos sonhos que deturpam o viver humano, mas criando condições para que a luz que nos orienta resplandeça. Fixar-se nas trevas para, permanentemente, lamentar a vida ou deter-se perante as suas influências, não coincide com a mensagem natalícia. Importa ver a luz e, particularmente, consciencializar-se da responsabilidade de ser luz. Aqui devemos concentrar as nossas energias: ser mensageiros de Boas Novas capazes de proporcionar esperança e vontade de viver. Natal é confiança, optimismo, certeza de que a luz brilhará sobre as trevas.
A luz, para a Igreja, é a Palavra onde encontramos Cristo. Isso ouvimos há momentos. “Com efeito, no texto revelado é o próprio Pai celeste que vem amorosamente ao nosso encontro e se entretém connosco a manifestar-nos a natureza do Filho unigénito e o seu desígnio de Salvação para a humanidade”. (João Paulo II, N.M.I. 40).
Neste texto do Papa vemos como o Natal nos vem solicitar a descoberta da Palavra e elucidar do dinamismo tripartido que ela encerra.
1 - A Palavra é sempre Deus que “amorosamente” vem ao nosso encontro. Há uma iniciativa. Resta-nos acolher ou rejeitar sabendo que a aceitação necessita duma atitude de silêncio para compreender os seus conteúdos em profundidade. O demasiado barulho da vida é a causa do pouco gosto pela Palavra.
2 - Deus tomando a iniciativa joga com aquele ou aquela que se dispõe a acolher. Ele “entretém-se” para revelar o Verdadeiro rosto de Cristo e fá-lo comunicando-se aos corações humildes e simples e começa, por causa de Cristo, a ter outra visão das coisas, das pessoas e do mundo. É uma lógica nova e diferente e uma compreensão da realidade marcada por coordenadas e parâmetros que só o abandono a estas revelações consegue dar.
3 - Deus entretém-se com quem manifesta abandonar-se aos seus critérios, suscitando um compromisso para que a salvação da humanidade vá acontecendo. Em Cristo ela já aconteceu e teremos de descobrir estes sinais positivos e a partir deles prosseguir uma autêntica promoção social onde as injustiças acabam e permitimos que todos se possam sentar à mesa comum da dignidade e fraternidade. A violação dos direitos humanos não é uma fatalidade e não nos podemos resignar a tantos sofrimentos desnecessários e imerecidos que quotidianamente presenciamos.
Onde há pobreza não há dignidade humana. Isto exige que sejam implementados todos os mecanismos institucionais que permitam a sua verdadeira erradicação da sociedade. Sabemos que tem muitas causas mas, na actualidade e num futuro próximo de crise económico-financeira a crescer perante os tempos que são difíceis e se tornarão mais complexos, o desemprego é a principal causa geradora desta situação. Encontrar uma situação de pleno emprego não é fácil mas os poderes públicos não podem sentir-se dispensados de encontrar medidas pertinentes e fazer com que sejam aplicadas com eficiência e em benefício de todos. Aqui a família merece toda a atenção e a ela se devem proporcionar as condições necessárias para que possa usufruir do necessário.
O desemprego vem dificultar uma vida familiar digna. Creio que a existência de famílias sem capacidade para encarar um futuro de serenidade, muitas vezes endividadas ou, outras vezes, incapazes de chegar a um crédito que não obstacularize o equilíbrio quotidiano e aí acontece o desemprego, como resultado duma inovação insuficiente e pouco alicerçada na competência profissional ou de jogos pouco claros de alguns que souberam zelar pelos seus interesses desrespeitando os direitos dos assalariados, são os desafios que teremos de encarar em nome duma salvação da humanidade. São trevas densas que impedem que a luz dum verdadeiro amor brilhe para todos.
Celebramos, este ano, os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Estamos a verificar que são bonitas intenções mas teremos de reagir. A Salvação de Cristo é integral, ou seja, humana e espiritual. Que o Natal nos torne denunciadores de tantas injustiças e não aceitemos, com facilidade discursos demagógicos que pretendem iludir-nos. Acordemos para ver os problemas e lutemos por uma humanidade de direitos para todos.
Neste Natal quero fixar-me na esperança e acreditar que seremos capazes de caminhar no compromisso e entre-ajuda para que o mal seja vencido e consigamos saborear a beleza dum Deus que vive connosco neste emaranhado de problemas e que nos dará força para fazer renascer a vida e a alegria de viver. A glória de Deus está ensombrada pela real situação de muitas famílias onde se dá o desemprego. Provoquemos Natal e saibamos, pela solidariedade activa, responder. Algo mudará.

† D. Jorge Ortiga