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CMAB | Pemba, Moçambique| 19 Jan 2017
A mãe do Janeiro
Pe. Jorge Vilaça, Comunidade Salama! Cooperação Missionária Braga-Pemba
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  © Pe. Jorge Vilaça | Ocua, Pemba, Moçambique

1. Quase todas as aldeias têm um Janeiro. O mês de Janeiro, sim, mas também uma pessoa como o “nosso” Janeiro. Explico: na minha actual aldeia vive um jovem chamado Janeiro. É a alegria em pessoa. A vida dele acontece no cirandar diário de um lado para o outro, descalço, segurando as calças com as mãos, balbuciando umas palavras, sempre sorridente. Não suporta chinelos ou sapatos que lhe acomodem os pés, mas nem por isso anda rente ao chão: saltita, cambaleia, conforme caminha. Não teme o chão que pisa. Sempre expressivo (“bom dia!”; “camisa!”; “bonito!”), usa uma linguagem muito própria da qual se decifram algumas palavras em português, outras em macua, outras em “janeirês”. Rapidamente o Janeiro impõe a sua presença. Aliás, faz questão de ser o centro: umas vezes pelo sorriso rasgado, outras pelas palavras atabalhoadas, outras pela exuberância dos movimentos. Conhecido de toda a gente, estimado por uns, achincalhado por outros... é o Janeiro da aldeia.

2. O Janeiro tem, desde nascença, uma deficiência mental. Atenção: tem, digo eu, uma deficiência. Não é um “tolinho”, mesmo que às vezes – infelizmente – o provoquem a fazer essa figura e ele a vista perfeitamente para alegria da populaça. O Janeiro, ao seu ritmo, entende as coisas, distingue o bem e o mal, sente, aprende... Sabe distinguir no nosso rosto quando estamos a chamar a atenção para não fazer de “tolinho”; sabe vir de “mansinho” como quem pede perdão depois da asneira; sabe dobrar uma toalha com perfeição; sabe quais são as meninas mais bonitas... É fácil ser-se conquistado pelo Janeiro. É ainda mais fácil desprezar-se o Janeiro. Aqui na minha aldeia. Talvez só aqui...

3. Quem é a família do Janeiro? Três irmãos, mais novos, todos com diversas deficiências graves congénitas e a mãe, magra e envelhecida pela dureza da vida. O pai, faleceu. Onde mora esta família: numa casa de barro, coberta de palha. O que comem? Diz a mãe do Janeiro: “Comemos matranca – farinha de mandioca – uma vez por dia. Às vezes arranjo ervilhas na minha machamba – horta”. O que vestem? Deixo à imaginação... Higiene? Imaginem... Onde dormem? Imaginem... Escola? Imaginem... Os rendimentos desta família? Uma horta de mandioca e ervilha.

4. A mãe do Janeiro não é somente o inexistente prémio nobel da gestão familiar. Ela não existe. Para ninguém. Ou melhor, existe para os seus filhos. Só para eles. Estes dias veio “namorar” uma porta velha e partida que temos no quintal (a casa dela ainda não tem porta de entrada). Senti-me envergonhado. Quando há tempos estivemos a tentar conversar, não me pediu rigorosamente nada. Perguntou-me só: “se os meus filhos morrerem, vão ter funeral cristão?”.

5. Estamos em Janeiro, mais ou menos em todo o mundo. E há tantos Janeiros e mães do Janeiro. Mas só em Dezembro voltaremos a lembrar-nos deles. O Janeiro é bonito em Dezembro. Portanto, temos onze meses para nos preocuparmos com “coisas”. Ó mãe do Janeiro, não ouso guardar o teu nome. Perdoa-me, mas não poderia dormir descansado. Nunca.

Artigo publicado no Suplemento Igreja Viva de 19 de janeiro de 2017.

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